HÉLIO OITICICA, QUASE-CINEMAS E AS RELAÇÕES COM A VIDEOINSTALAÇÃO CONTEMPORÂNEA [parte II]

Dissertação apresentada ao Instituto de Artes, da Universidade Estadual de Campinas, para obtenção do Título de Mestra em Artes.

Orientador: Prof. Dr. Gilberto Alexandre Sobrinho.

CAMPINAS 2012

Eu não me transformei em um artista plástico, eu me transformei em um declanchador de estados de invenção. (Oiticica, 2009, p.234)

 

 

L’art doit avant tout être un art de vivre; il faut profiter de l’instant présent, en accord avec l’expression de la nature. Maintenant, et non hier ou demain.[1] (Bressane, AHO 2524.92, p.58)

 

 

levitar a vida!

engravidar a arte!!

dane-se o dia… (Beso, 2011, p.57)

 

 

 

 

Resumo 

Esta pesquisa analisa as propostas ambientais/fílmicas de Hélio Oiticica produzidas na década de 1970: os quase-cinemas. Por meio dos usos dos suportes do cinema, fotografia e som, e questionando o cinema narrativo e a posição apenas contemplativa do espectador, o artista concebeu espaços sensoriais, experiências quase-cinematográficas que propõem a recusa ao objeto acabado, o convite à participação e novas relações espaço-temporais que alteram o modo de percepção do visitante. Essas propostas se relacionam com o contexto artístico de sua época como, por exemplo, as experiências cinemáticas criadas pelo grupo Fluxus (os fluxfilmes), os eventos de Jack Smith, o Cinema Expandido, o Cinema Marginal e as práticas do Super-8 brasileiros. Em seguida, discute-se as possibilidades dialógicas dessas experiências com os conceitos e algumas práticas de videoinstalação. Esta aproximação tem como premissa trazer questões estéticas referentes à arte contemporânea, a saber: a exploração dos diversos suportes possíveis, a imersão no espaço, a presentificação do tempo e a participação do público na obra. Tais temas, que já eram amplamente abordados pelo artista, se fazem também expressivos na poética atual das videoinstalações. Finalmente, busca-se uma aproximação da poética da artista/pesquisadora com os procedimentos estudados.

Palavras-chave: Hélio Oiticicaquase-cinemacinema experimental,videoinstalaçãoarte contemporânea.

Abstract 

This work aims at investigating the environmental and filmic proposals by Hélio Oiticica produced in the 1970’s: the quasi-cinemas. Using different devices such as film, photography and sound, and putting into question the narrative cinema and the contemplative/passive position of the viewer, the artist conceived sensorial spaces, quasi-cinematographic experiences in which he desired to refuse the idea of the finished object, the call for active participation and new time/space relations focused on the changing the perception mode of the visitor. These proposals are related to the artistic context of that time, such as the cinematic experience created by the group Fluxus (the fluxfilms), Jack Smith, the expanded cinema and the Brazilian’s Cinema Marginal and super-8 practices. Then, it is discussed the possibilities of such dialogical experiences with some of the concepts and practices of video installation. This approach is premised on bringing aesthetic issues relating to the contemporary art, for example through the exploration of different medium possibilities, the immersion in space, the time durative and the participation of public in the work. Such themes, which were widely covered by the artist, are also significant in the poetic form of video installations today. Finally, it is brought an approximation between the questions described above with the art work by the artist/researcher, Natasha Marzliak, author of this dissertation.

Keywords: Hélio Oiticica, quasi-cinemas, experimental cinema, video installation, contemporary art.

 

 

Sumário

Introdução

1. Quase-Cinemas: Blocos de Mundo-Abrigo, de Mundo-Playground

1.1. Os anos 1970: a invenção dos quase-cinemas

1.2. Cosmococas: work in progress (CC1 a CC9)

2. Labirinto Contextual: Fluxus, Jack Smith e Cinema Expandido

2.1. Mundo-abrigo: Mapeamentos

2.2. Ideias-mundo erigindo invenções

2.2.1. Fluxfilmes

2.3. Manifestação Ambiental, Quase-Cinemas e Jack Smith

2.4. O Cinema Expandido

3. Quase-Cinemas, Super-8, Performance e as Videoinstalações Contemporâneas

3.1. Experimentalismo no Brasil: a bitola Super-8 no cinema de artista e suas relações com os quase-cinemas

3.2. Vídeo e Performance: a incorporação do outro na obra

3.3. Corpo-casa

3.4. Prenúncios da Videoinstalação

3.5. Videoinstalação

4. Filme da autora: Gio-Gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual

Considerações Finais

Referências Bibliográficas

 

 

 

 

2. Labirinto Contextual: Fluxus, Jack Smith e Cinema Expandido

Esse capítulo busca aproximar e relacionar a obra/pensamento de Hélio Oiticica com algumas referências contemporâneas ao contexto artístico e cinematográfico em que se deram suas produções. Essas possíveis afinidades possibilitam articular uma visão mais ampla dos quase-cinemas, sendo de especial interesse da pesquisa as apropriações e expansões do artista com o vocabulário cinematográfico. Vale destacar que não estamos interessados num jogo causa e efeito, ao ativar o contexto de produção, mas sim, buscamos nas relações elementos que possam ampliar nossa visão sobre as propostas de Oiticica. Dessa forma, os domínios pesquisados foram: os novos meios tecnológicos usados como suporte de expressão nos anos 1960 e 1970 (o vídeo e o Super-8), os fluxfilmes e as vanguardas cinematográficas, sobretudo, o trabalho de Jack Smith e o Cinema Expandido.

Slide de CC3 Maileryn                 Slide de CC3 Maileryn62

Devir estético da existência e do mundo, que está diretamente ligado à ascensão da cultura de massas, com seu poder de criação e diluição de signos, processos, imagens. Hiperatividade estético-midiática que Hélio não parou de afrontar e problematizar, colocando a seguinte questão, que atravessa toda sua obra: “que é ou quem poderia ser um criador?” Como criar “estados de invenção” abertos a qualquer um? (BENTES, 2002, p.139)

 

2.1. Mundo-abrigo: Mapeamentos

Desde o início do século XX alguns artistas já postulavam a inadequação dos meios convencionais, como a escultura e a pintura. Ao refletir sobre os novos desenvolvimentos tecnológicos, científicos e intelectuais, começaram a se servir de novos suportes para suas práticas artísticas, como o vídeo e o Super-863. Como observa Arlindo Machado, artistas como Hélio Oiticica experimentaram expandir o campo das artes plásticas ao mesclar diversos suportes, produzindo uma obra sem fronteiras, antecipando características da produção da arte contemporânea:

Como se sabe, a partir de meados da década de 60, muitos artistas tentaram romper com os esquemas estéticos e mercadológicos da pintura de cavalete, buscando materiais mais dinâmicos para dar forma às suas ideias plásticas. Alguns saíram para as ruas e produziram intervenções na paisagem urbana. Outros passaram a utilizar o próprio corpo como suporte artístico e converteram suas obras em performances no espaço público. Outros ainda procuraram mesclar os meios e relativizar as fronteiras entre as artes, produzindo objetos e espetáculos híbridos como as instalações e os happenings. E houve também aqueles que foram buscar materiais para experiências estéticas inovadoras nas tecnologias geradoras de imagens industriais, como é o caso da fotografia, do cinema e, sobretudo, do vídeo. Nos anos 70, Hélio Oiticica introduziu a ideia fertilíssima do quase-cinema (cf. Canongia, 1981), para designar um campo de experiências transgressivas dentro do universo das mídias ou das imagens e sons produzidos tecnicamente. (MACHADO, 2007, p.17)

Para entendermos o processo de utilização dos novos materiais dentro do universo contemporâneo, é importante o reconhecimento de como esses artistas começaram a abandonar os suportes tradicionais de arte para fazer uso de novos meios, principalmente os tecnológicos. A partir do final dos anos 1950 e durante a década de 1960, nos EUA, mas também em todo o mundo, segundo Rush (2006, p.17),

havia uma inquietude no mundo artístico que se manifestou no surgimento da arte pop, dos experimentos multimídia de John Cage e de seus colaboradores de Black Mountain College: Robert Rauschenberg, o dançarino/coreógrafo Merce Cunningham e o músico David Tudor.

Assim, as décadas de 1960 e 1970 continuaram a enfrentar um momento de ruptura e transgressão, pois não havia sentido em continuar com a arte do puramente visual, que é aquela produzida através de meios tradicionais e com fim de contemplação. Assim, as novas tecnologias, como o vídeo e a televisão, se tornaram cada vez mais instrumentos para criação e a arte aproximou-se das pessoas, da vida que era urbana, tecnológica, subversiva e se inscrevia em um contexto politizado, nos quais inúmeros atores sociais outsiders e suas causas vieram à tona, como é o caso, principalmente, dos negros, das mulheres e dos homossexuais. A arte, então, começou a articular diversas linguagens, com a intenção de romper com as antigas ideias de representação na obra. O cinema, o teatro, a dança, a música e a literatura, por exemplo, não poderiam mais ser classificados separadamente, o que fez mudar a definição do que seja uma obra de arte. Paula Braga extraiu texto de Kinaston Mcshine, do catálogo da mostra Information, ocorrida no MOMA-NY de julho a setembro de 1970, onde ele relata o momento político e social em que os artistas estavam vivendo ainda naquele momento:

Se você é um artista no Brasil, você sabe de ao menos um amigo que está sendo torturado; se você é um artista na Argentina, você provavelmente teve um vizinho preso por usar cabelos compridos ou por não estar “vestido” corretamente; e se você vive nos Estados Unidos, você pode temer ser baleado ou na universidade, ou na sua cama, ou mais formalmente na Indochina. Pode parecer muito inapropriado, ou mesmo absurdo, levantar-se de manhã, entrar numa sala e aplicar pinceladas de tinta vinda de um pequeno tubo a uma tela quadrada. O que você pode fazer como jovem artista que lhe pareça relevante e significativo? (…) uma alternativa tem sido estender a ideia de arte, renovar sua definição, e pensar para além das categorias tradicionais – pintura, escultura, desenho, gravura, fotografia, teatro, música, dança e poesia. (MCSHINE, 1970, p. 138)

As décadas de 1960 e 1970 em Nova York e no mundo enalteceram a cultura midiática urbana: o mundo das celebridades, o glamour, o star system de Hollywood, o rock, a rádio, a TV. Foi também um período de subversão, da cultura das drogas, das novas experiências artísticas. Ao tangenciar as vanguardas cinematográficas – nouvelle vague, cinema underground, cinema experimental brasileiro, Marginal e super-8, Cinema Expandido, fluxfilmes – Oiticica se relacionou com as demandas das metrópoles de sua época. Assim como Andy Warhol, o artista era atraído pelo mundo das celebridades, dos marginais e dos anônimos. Para ele, a década de 1970 em Nova York foi um momento de afastamento da marginalidade do samba e da cultura dos morros, e de estreitamento dos laços com o rock e o mundo subversivo de Manhattan, de forma a articular ideias que apontaram as bases da construção do seu pensamento e ação em arte e cinema: “não-narração, multimeios, interação, pop-arte e antiarte, happening, performance” (BENTES, 2003, p. 140). Daí deu-se o insurgimento do seu programa de invenção, baseado no experimental, na vivência do corpo e espírito dentro de um ambiente coletivo:

A antiarte é pois uma nova etapa (é o que Mário Pedrosa formulou como arte pós-moderna); é o otimismo, é a criação de uma nova vitalidade na experiência humana criativa; o seu principal objetivo é o de dar ao público a chance de deixar de ser público espectador, de fora, para (ser) participante na experiência criadora. É o começo de uma expressão coletiva […] (OITICICA, AHO 253.66)

Para essa pesquisa, o estudo do contexto em que Hélio Oiticica estava inserido permeia os conceitos acima citados e forma-se como base de análise que objetiva estabelecer as linhas transversais de conceitos que o ligam aos fluxfilmes, a Jack Smith e ao Cinema Expandido, e ao Cinema Marginal e às experiências com Super-8 no Brasil, o que consiste em um caminho traçado para o entendimento dos desdobramentos do seu pensamento na cena da arte contemporânea, sobretudo nas videoinstalações.

 

2.2. Ideias-mundo erigindo invenções

FLUXUS ART-AMUSEMENT

To establish artist’s nonprofessional status in society,
he must demonstrate artist’s dispensability and inclusiveness,
he must demonstrate the selfsufficiency of the audience,
he must demonstrate that anything can be art and anyone can do it.64

Estudar o processo artístico de Hélio Oiticica prevê o caminhar em um labirinto de ideias. Suas inúmeras referências e afinidades com diversos artistas, conceitos, épocas e domínios, postuladas em seus textos e artigos, nos permitem reconhecer como ele construía seu pensamento e seu programa de invenção.

Como mostra Paula Braga (2007), existe em Oiticica uma multiplicidade de artistas, o que é revelado pela entrevista do artista a Ivan Cardoso:

IC – Você vê ligação das coisas que faz com outros artistas?
HO – Vejo assim uma ligação de famílias de inventores… De pontos luminosos como diria o Haroldo, parafraseando Pound, que por sua vez já parafraseava Dante… Há coisas na história que me interessam sempre (…) quem ainda não descobriu a solidão, ainda não descobriu o estado de invenção. O estado de invenção é profundamente solitário, mas ele é profundamente coletivo. Tem uma coisa que eu sempre cito e que é uma constante em mim, que eu acho muito importante, que eu descobri em Nova Iorque, é uma coisa do Sartre, quando ele fala da posição do artista e do criador no mundo atual, que a gente está numa fase de emergência do coletivo, a gente está numa passagem do individual, de valores individuais e individualistas para o coletivo, então na realidade a gente está dividido, entre o mais individual e ao mesmo tempo imergindo nessa emergência do coletivo. (1990, p. 73)

Oiticica escrevia sobre os pensamentos de artistas, cineastas, filósofos e músicos (por exemplo, Yoko Ono, Neville D’Almeida, Nietzsche, Bergson e John Cage), ao enxergar em suas obras uma sorte de similaridade e confirmação de suas ideias dentro do seu objetivo de (re) criar a (e na) vida. Como bem sintetizou Braga:

As estratégias construtivistas na obra de Hélio Oiticica estão compreendidas na noção definida pelo artista de “mundo erigindo mundo”. Esta estratégia é identificável tanto nos aspectos éticos e estéticos das proposições de Oiticica quanto na maneira como seu próprio pensamento é construído de blocos achados nas obras de filósofos, músicos e outros artistas. Escrever fazia parte do seu processo criativo, seus textos, portanto, estão completamente associados às experiências. (2007, p. 2)

Segundo Brett: “Escrevia sem parar, como um acompanhamento de seu trabalho, escrevia tanto que é talvez preferível encarar os dois como uma só atividade, uma corrente incessante de invenção e pensamento” (1996, p.277). Em Oiticica, a prática e a escrita caminhavam juntas, e, como afirmou Haroldo de Campos, parafraseando Pierre Boulez, Oiticica conseguia “organizar o delírio” (SALOMÃO, 1992).

Artistas construtivos como Mondrian e Malevitch e depois, do momento pós-modernista65, como Yoko Ono e o músico John Cage, são, então, exemplos de inventores que possuíam ligações com Oiticica. Em suas palavras:

Mondrian, para mim, é um desses pontos luminosos… na realidade tem pontos e pontos luminosos… A tendência é só haver pontos luminosos, não interessa mais o artista de média, o artista que media, o artista não inventor não interessa mais, então para mim só interessa pontos luminosos: os artistas que são grandes inventores. (OITICICA, 1990, p. 76)

John Cage e Yoko Ono, integrantes fluxistas, dialogam com quase-cinemas principalmente pelas práticas que primam a desestetização da arte, a participação do antigo espectador contemplativo e a integração da arte na vida. Cage, compositor da célebre peça 4’33″, foi muito referenciado em textos de Oiticica pelo diálogo com o cotidiano. Produzia músicas não-narrativas, ao incorporar momentos silenciosos e ruídos retirados do meio ambiente, além de marteladas sobre a madeira e sobre as cordas de um piano, entre outros exemplos, o que ele chamava de música de acaso. Em 4’33’’, o público era necessariamente parte da obra, quando os momentos de silêncio nas apresentações do músico eram invadidos por barulhos casuais vindos da plateia. O efêmero, o fluido da vida, era incorporado ao processo criativo, que tinha uma programação anterior, porém, entrecortada por momentos ocasionais. Em quase-cinemas percebemos a inspiração em Cage, no que concerne o acaso, na construção das imagens e das trilhas sonoras dos blocos-experiências de Cosmococas:

[…] acaso como jogo aparece 1- na hora de tirar as fotografias 2- na ordem em que elas são colocadas na caixa pelo laboratório de revelação 3 – na ordem em que são colocadas no carrossel. (OITICICA, PHO 0189/73, p. 59)

Como Oiticica desejou trabalhar o estatuto da imagem de maneira a quebrar seu status soberano, diz não tê-las escolhido, mas que elas vieram até ele. Porém, diferentemente de Duchamp, o acaso de encontrar as imagens prontas não é o bastante, é preciso inová-las, juntar as peças do jogo para recriá-las.

Segundo ele:

– o READY-CONSTRUCTIBLE
substitui-herda o conceito
de READY-MADE

INOVA-O

ele instaura

FUNDA ESPAÇO

FUNDA ESPAÇO

( EM ) ABSOLUTO (Idem, PHO, 0088/78, p. 1)

Para ele, o acaso não se refere ao objeto em si. O objeto não é colocado casualmente, o acontecimento do acaso ocorre justamente no decorrer das ideias, pensamentos e atitudes que provém do ambiente proposto pelo artista. Além dos quase-cinemas que têm projeção de slides e ambientes construídos, o acaso também é referenciado no filme Agrippina é Roma-Manhattan, quando o ator- travesti Mário Montez joga dados com Antonio Dias na calçada.

John Cage integrava o Grupo Fluxus66, que teve seu início em 1961, em Wiesbaden, na Alemanha, durante o Festival Internacional de Música. Sob a liderança de George Maciunas, era constituído por artistas, cineastas, músicos e atores de diversas partes do mundo. Dentre eles, transitaram pelo grupo: Joseph Beuys, Wolf Vostell, Nam June Paik, Bem Vautier e Yoko Ono. Para Rush, Fluxus era “um movimento ‘entre meios de expressão’”: críticos, provocativos e mergulhados em humor irônico, esses artistas tentavam ampliar as diferentes formas de expressão. Ao integrar diferentes linguagens, sobretudo tecnológicas, a manifestação da arte se dava através de happenings, performances, filmes, instalações e vídeo-arte: “art must appear to be complex, pretentious, profound, serious, intellectual, inspired, skillful, significant, theatrical”67. Suas realizações compõem objetos, sons, movimentos e luzes, onde os sentidos do espectador são convocados a participar. Suas experiências não possuem sequências de atos pré-estabelecidas; assim, o público pode (deve) ir para qualquer lugar, para onde desejar. A participação aqui é condição primária para a construção de obra, pensamento e vivência. Cosmococas é, igualmente, uma arte ambiental, composta por objetos diversos, construída para desestetizar, destruir a imagem sagrada, o objeto pronto, sendo obra aberta para participação do público, que possibilita sentidos e constrói pensamentos.

Além disso, influenciado pelo dadaísmo e Marcel Duchamp68, Fluxus contrariava a política elitista dos museus e galerias de arte69 e a ideia de que o artista é sagrado, o único detentor da capacidade de produzir arte. Opondo-se à produção de obras individuais, pregava a criação coletiva, onde qualquer pessoa poderia entender e criar arte, o que o aproxima do Construtivismo Russo no que se refere à função social e a participação na política por parte dos artistas. O museu, para o grupo, era uma instituição construtora de padrões que, em sua estrutura original, deveriam ser cegamente seguidos, não permitindo que os artistas fossem “(…) como um córrego que flui, uma sucessão continua de mudanças” (MACIUNAS, 2002, p.94).

Com espírito dadaísta, os fluxistas negavam os padrões estabelecidos, pregavam a antiarte e evocavam a desmaterialização do objeto de arte e a participação do antigo contemplador, movimentando ideias, corpos, lugares e tempos, em um universo onde o processo criativo acontece através da destruição da fronteira entre a arte e a vida e da construção de pensamento novo. Para esses artistas, havia um vínculo que era primordial para a manifestação da arte: os objetos cotidianos, os eventos e a própria arte. Dessa forma, concretizavam a ideia através de performances minimalistas, mas que eram acessíveis a qualquer pessoa, pois se tratavam de eventos-ações não-elitistas:

Um evento do Fluxus, como definido pelo artista teuto-americano George Brecht, era a menor unidade de uma situação. Um deles, concebido pelo artista Mieko Shiomi, foi descrito como “um evento aberto” – simplesmente “um convite a abrir algo fechado”. Pediu-se aos participantes que escrevessem exatamente o que havia acontecido durante o “evento”. Essa simples tarefa tornou-se um manifesto contra a arrogância da arte em museus, bem como uma ação participativa porque as pessoas se reuniram para realizá-la. (RUSH, 2006, p.18)

Os eventos fluxistas possuíam, ainda, instruções para performance, deixando ao acaso as inúmeras possibilidades de interpretação, o que também ocorria nas ambientações de quase-cinemas. Cosmococas, por exemplo, também possui instruções, que são diferentes para as ações públicas e as privadas, e que deixam claro que a obra é aberta às possíveis eventualidades.

 

2.2.1. Fluxfilmes

Os fluxfilmes possuem referências estéticas da poesia concreta, da arte dadaísta e da música experimental de Arnold Schönberg. São, no total, 40 filmes curtos, feitos na maior parte das vezes por artistas, e não por cineastas. Rejeitando a imagem sagrada das obras de arte, produziam filmes que traziam significado para os objetos comuns. Ao criarem filmes minimalistas, sem história narrativa complexa e com ações repetitivas, colocavam em cheque as associações habituais do espectador contemplativo. O fluxfilme Zen for Film (1962-64), de Nam June Paik, foi apresentado no apartamento de Maciunas em Nova York70 como um evento que misturava instalação, filme e performance (do observador-participante): uma tela caseira disposta na parede como se fosse uma pintura, um piano e um contrabaixo. O filme dava pouca importância à grande – e cara – indústria cinematográfica hollywoodiana; no fundo, era em tudo contrário a ela, sabendo-se que, na tela, por exemplo, foram projetados 30 minutos de película (16mm) em branco. Aqui, o mínimo elementar era a película, a projeção na tela sem alguma imagem. Paik haveria insuflado “um aspecto de performance no contexto da tela e, ao fazê-lo, libertou o observador das manipulações tanto do cinema comercial quanto do cinema alternativo” (JENKINS apud RUSH, op. cit., p. 19). O objetivo dos fluxistas era eliminar qualquer condicionamento possível que poderia desenvolver um filme narrativo ou mesmo de vanguarda. Chegando ao mínimo da ação, possivelmente se abririam portas antes fechadas nas mentes de quem via o filme, possibilitando uma variedade de pensamentos e construções de imagens e poéticas individuais.

 

2.3. Manifestação Ambiental, Quase-Cinemas e Jack Smith

Uma característica importante do programa de Oiticica é tirar radicalmente a obra de arte do museu – segundo Lisette Lagnado, sua atividade passou a ser “subterrânea” (2003, p.3) –, acabar com seu isolamento, fazê-la vir até o público, que por sua vez precisa participar da obra para que ela se construa:

[…] Quando proponho um shelter71 para a época de minha obra de MANIFESTAÇÃO AMBIENTAL, na verdade proponho o fim do ‘museu’ ou da ‘coleção privada’, ou melhor, quero mostrar q essas obras não se destinam a esses fins. (OITICICA, PHO 0316/73, p. 9)72

A desativação dos meios tradicionais de expor e contemplar arte é uma das ações propostas pelo Programa Ambiental de Oiticica, que chega ao seu limite na década de 1970, justamente quando somou a ele suas ideias de rompimento com a estrutura tradicional do dispositivo cinema. Esse programa já vinha se desenvolvendo a partir de 1959, quando Oiticica partiu da experiência com a cor, através dos Metaesquemas, e instaurou o “fim da pintura”, criando os Núcleos e Penetráveis, os Bólides, os Parangolés e, finalmente, a Manifestação Ambiental, que fez deslocar o espaço e o tempo, instaurando a participação do antigo espectador contemplativo que agora era levado, através de experiências suprassensoriais, a mudar sua forma de se comportar e de enxergar o mundo. Forma-se, em torno do Programa Ambiental, uma teia de conceitos coesos que permeiam toda a sua obra.

Em 1968 Oiticica escreve sobre o projeto Barracão, cujo

objetivo seria o de construir uma casa em madeira como as das favelas, onde as pessoas a sentiriam como se fosse o lugar delas, talvez nas montanhas perto daqui, onde o meu grupo iria para fazer coisas, conversar, conhecer pessoas73;

este teria surgido através da necessidade de expandir a corporalidade dos Parangolés para um espaço arquitetural para lazer inventivo (o conceito de Crelazer aqui se radicaliza). A ideia era a de transformar a moradia em obra aberta para “experimentações-limite” (e não para construção de obras) através da vivência individual em um ambiente coletivo, cuja estrutura formasse um todo “corpo-ambiente”:

BARRACÃO não seria algo q se pudesse reduzir a “arquitetura experimental” mas como q estrutura transformável segundo as atividades experimentais de um determinado grupo ou mesmo de um indivíduo (o que seria a suprema ironia); BARRACÃO seria modelo experimental do lazer como atividade positiva: essa atividade estaria ligada na origem à necessidade de assumir e tomar de assalto o comportamento como elemento principal atuante na experimentalidade-núcleo acima referida: nada de grupo dedicado “de boa fé” ao “espírito” ou à “arte”; seria núcleo de experimentações-limite – esse grupo é o q de mais variável e hipotético se possa prever: na verdade como eu pensara e quisera não o foi: a situação geral de desintegração do q é experimental no Brasil tornou impossível e suicida a experiência: e me fez ver algo: q o sentido e a natureza do projeto BARRACÃO é a de estrutura adaptável e cujas origens e diretivas podem dar origem e erigir a experiência em outras circunstâncias não limitada (o projeto BARRACÃO) a lugar e tempo; se o q houve no BRASIL castrou a experiência ainda em projeto ela como semente q é não se limita a essa circunstância-limite: ela é circunstância aberta: projeto circunstancial: que é a natureza mesma dela: se o lazer tomado como experimentalidade está submisso a circunstâncias de ordem social-ético-política ao dia-a-dia na própria sequência de vida dos indivíduos q nela se envolvem e q nem se sabe se é sequer possível experimentado mesmo nos princípios gerais e mesmo q de modo superficial seja abordado então não se pode querer limitá-lo a programa limitado a deadlines mesmo q amplas: é programa pra vida: é programa que se discuta e no qual a discussão da razão de ser dos valores deva ser constante: é experiência q deve sofrer etapas q têm que nascer, desaparecer, renascer e transformar-se segundo circunstâncias de ordem geral: de ordem aberta: de modo q o q se mantém constante é no fim a proposta inicial no estado mais direto: o lazer como núcleo experimental é o proposto como síntese de experiências propostas ligadas ao comportamento: corpo-ambiente: o dia-a-dia como campo experimental aberto. (OITICICA, 25/01/1986)

O projeto não foi realizado naquele momento, no Rio de Janeiro, porém, a ideia de viver em permanente estado de lazer inventivo se concretizou quando morou em Nova York na década de 1970, quando Oiticica transformou seus dois apartamentos em “ninhos”. Nas palavras de Décio Pignatari (1980):

Em sua casa, em torno de um beliche, montou um penetrável ambiente de ninho parangolé – uma teia labirinto bricolada de todas as colagens, acrescida de toda uma parafernália informacional ao alcance da mão: do lápis ao arquivo, do aparelho de som à televisão, um sempre ligado, outra sempre sem som; frases-lema pelo teto. E ele lá em cima, deus e pássaro. Livros. Leitura. Risos. Sonhava um grande voo.

Seus amigos o visitavam constantemente, como a visita de Neville D’Almeida, que gerou as fotografias de Cosmococas – programa in progress, além das entrevistas com amigos para os “Heliotapes”. Essas vivências criativas podem ser comparadas com as que aconteciam no apartamento de Jack Smith. Mesmo a cinematografia de Hélio Oiticica pode ser analisada traçando paralelos, linhas de força que também estão presentes nas experiências com slides de Smith. Após ter passado oito anos trabalhando com o cinema tradicional, a partir da década de 1970 Jack Smith começou a incorporar performances a seus filmes, a trabalhar objetivando a desconstrução do dispositivo cinema através dos slides, além do uso de multiprojeções, o que antecipou o que Gene Youngblood denominaria ainda em 1970 de Expanded Cinema. Nas performances, ele projetava nas paredes de seu apartamento recombinações de imagens de slides e de seus filmes, misturados, e muitas vezes editava as películas ao vivo usando fitas adesivas (antecipando também o Live Cinema). Ao mesmo tempo, construía sons com vinis e fazia uma ação teatral ao vivo. Não havia roteiros, tudo se passava de maneira espontânea, casual. As pessoas que frequentavam seu apartamento se sentiam parte integrante da performance.

Com exceção de Agrippina é Roma-Manhattan, que é filme super-8 não- linear formado por blocos-cinema, os quase-cinemas constroem ambientações de imagens não-narrativas e sons montados casualmente para performance do público, através da multiprojeção de slides. Consiste na radicalização dos conceitos da Arte Ambiental. Nas palavras de Oiticica, que demonstram forte referência à Smith:

SLIDES: não-audiovisual porque a programação quando levada à performance amplia o alcance da sucessão desses SLIDES projetados q se enriquecem ao se relativizarem numa espécie de ambientação corny: JACK SMITH com seus slides fez algo q muito tem a ver com o q almejo com isso: do seu cinema extraiu – em vez de visão naturalista imitativa da aparência – um sentido de não-fluir não narrativo: os slides duravam no ambiente sendo q o projetor era por ele deslocado de modo a enquadrar a projeção em paredes-teto-chão: o sound track era justaposto acidentalmente (discos). (OITICICA, 1996, p.180)

 

2.4. O Cinema Expandido

When we say expanded cinema we actually mean expanded consciousness. Expanded cinema does not mean computer films, video phosphors, atomic light, or spherical projections. Expanded cinema isn’t a movie at all: like life it’s a process of becoming, man’s ongoing historical drive to manifest his consciousness outside of his mind, in front of his eyes. One no longer can specialize in a single discipline and hope truthfully to express a clear picture of its relationships in the environment. This is especially true in the case of the intermedia network of cinema and television, which now functions as nothing less than the nervous system of mankind. (YOUNGBLOOD, 1970, p.41)

À luz da era cibernética74 e para explicar as experiências dos anos 1970 que uniam cinema, vídeo e tecnologia digital, Gene Youngblood cunhou o termo “cinema expandido”. Menos utópico, André Parente (1993) acredita que o cinema expandido enquanto “processo de desocultamento do dispositivo do cinema e da produção de uma imagem processual, aberta, que envolve o espectador”, caracteriza-se, sobretudo, por duas ideias: consiste em instalações que rompem com a sala escura do cinema tradicional, reinventando o cinema em outros espaços expositivos – o cinema através da união da caixa preta do cinema e do cubo branco dos museus e galerias, de onde insurge a sua segunda vertente: a hibridização entre os suportes. Para Parente (1993), “[…] enquanto o cinema experimental se restringe a experimentações com o cinema e a videoarte se notabiliza pelo uso da imagem eletrônica, o cinema expandido é o cinema ampliado, o cinema ambiental, o cinema hibridizado.”

Dessa forma, o conceito de cinema expandido se instaura através de uma série de trabalhos experimentais que criticavam os mecanismos tradicionais do dispositivo cinematográfico, principalmente se através da “multiplicação dos níveis de projeção, abolição das fronteiras entre diferentes formas de arte, retorno à corporalidade, desconstrução das técnicas fílmicas e a criação de obras de arte feitas de pura luz” (SANTAELLA, 2003, p.162). O cinema tradicional é então substituído por essa nova forma de se fazer cinema, esse transcinema que redimensiona a arquitetura do espaço expositivo através das multiprojeções, por exemplo, explorando outras durações e fazendo com que o espectador aprecie uma experiência sensorial. Segundo Nina Velasco e Cruz: “O espectador passa a ter mais mobilidade diante da tela, rompendo com a sensação de imersão completa que o abandono do corpo na escuridão procura permitir.” (2009, p.53)

Propondo uma nova fruição estética ao antigo espectador do cinema tradicional, ao imergi-lo de forma a também despertar sua inteligência crítica, o programa quase-cinemas consiste em radical experimentação que se embrenha nos domínios do cinema. Discutindo o estatuto da imagem e os conceitos de plágio e autenticidade da obra de arte, essa experiência trata o descontentamento com a relação espectador-espetáculo, a qual é mantida pelo cinema tradicional. Ao construir ambientes-cinema, Oiticica expande esse dispositivo, formando uma trama sensorial que se estende à multiplicidade do espectador, que experimenta seu corpo em outros mundos de sensações. Nas experiências quase-cinemas, nota-se os sintomas que também estão presentes no cinema expandido, tais como a re-corporificação dos espectadores e a ativação de sua recepção e formação de pensamento.

Alimentado pelo contexto urbano em que estava inserido, pelo êxtase da cocaína, pelo rock, e questionando a representação em arte, o cinema narrativo e a posição apenas contemplativa do espectador, Hélio Oiticica propôs espaços sensoriais através dos suportes cinema, fotografia e som, construindo seu programa de invenção que desembocou na Arte Ambiental para participação coletiva. Trata-se de instalações multimídia, de experiências quase- cinematográficas, obra aberta cujos sintomas ressoam na videoinstalação contemporânea, substancialmente ao tensionar discussões concernentes à participação corpórea e sensorial do público, através do espaço-ambiente, da presentificação do tempo e do abandono do objeto acabado, enfatizando, assim, o processo. Nas palavras do artista: “Como soltar o CORPO no ROCK e depois prender-se a cadeira do numb-cinema?” (OITICICA, 1996, p.177)

 

3. Quase-Cinemas, Super-8, Performance e as Videoinstalações Contemporâneas

Com ênfase na performance, na incorporação do indivíduo na obra de arte, esse capítulo teve como objetivo analisar alguns conceitos e procedimentos das videoinstalações produzidas atualmente. No capítulo anterior, reconhecemos alguns elos que permitem o entendimento das relações entre os quase-cinemas de Hélio Oiticica e algumas vanguardas cinematográficas e artísticas das décadas 1960 e 1970. Segundo Ivana Bentes, o programa de Oiticica está inserido dentro de uma espécie de linha histórica que tem como ponto de partida as vanguardas cinematográficas dos anos 1920 e que passa pelo expanded cinema e pelas experiências entre-meios das décadas de 1960 e 1970, que “aproximaram as artes plásticas do cinema, da fotografia, do super-8, até chegar aos híbridos atuais, como as videoinstalações e experiências com Internet e realidade virtual” (2002, p.139).

A videoinstalação possui relações com as vanguardas artísticas e cinematográficas de fins dos anos 1960 e toda a década de 1970 (no Brasil e no mundo), que, através das experiências entre-meios, aboliram a representação linear e passaram a explorar a não-narração, através da fragmentação das imagens, além de também desenvolver a construção de espaços onde o tempo se tornou vivenciado. No Brasil, essas experiências vieram à tona na década de 1970, quando alguns artistas começaram a fazer uso do vídeo e do Super-8 como suporte de experimentação75.

 

3.1. Experimentalismo no Brasil: a bitola Super-8 no cinema de artista e suas relações com os quase-cinemas

Em entrevista para Hélio Oiticica (A Comunicação Pensada, registrada em um “Heliotape”), quando indagado sobre a questão da obra e o produtor de obras – os supostos artistas plásticos –, Décio Pignatari diz:

Não há obra. Mesmo a ideia de obra aberta, ainda no sentido de salvar a ideia de obras. Embora alguns tenham continuado a fazer obra, o ‘Lance de Dados’ de Mallarmé colocou em cheque a obra: não é nem obra nem não-obra. É uma coisa nova. (PHO 0301/74)

Os procedimentos artísticos de Hélio Oiticica interagiram, sem dúvida, com as práticas inovadoras em arte e cinema do seu tempo, as quais deram início a novas formas de expressão artística. No Brasil, no início dos anos 1970, além da sinergia com o Cinema Marginal, os trabalhos quase-fílmicos de narrativa não- linear de Oiticica, sobretudo o filme Agrippina é Roma-Manhattan (1972), possibilitam que este estudo perpasse pelo cinema superoitista dos anos 1970, de herança tropicalista76, sugerindo uma mudança comportamental através da inteligência do corpo, e, para além ainda, do erotismo: “Bissexualismo, travestis, desconstrução da imagem burguesa da mulher, frequentavam a bitola Super-8. Muitos dos filmes têm algo de festa dionisíaca, versão cinematográfica do desbunde.” (MACHADO, 2010a). Ao negar a representação e a linearidade de uma história, “[…] tudo o q de esteticamente retrógrado existe tende a reaver representação narrativa (como pintores q querem ‘salvar a pintura’ ou cineastas q pensam q é ficção narrativo-literária)”, Hélio Oiticica dialoga com o cinema de vanguarda brasileiro.

A década de 1970 pode ser considerada um dos momentos de contracultura e subversão mais forte frente ao regime militar no Brasil, que desde os anos 60 impunham “tempos difíceis” à realidade do país. Como atesta Rubens Machado:

De modo geral, a experimentação superoitista inscreve-se no momento pós-tropicalista, onde a dimensão política da arte fragmentou-se em experimentos ligados a uma visceralidade existencial, que buscava criar momentos de ruptura com a pesada ordem política e de mercado do “milagre” conduzido pela ditadura militar. (2010a)

Dentro desse contexto, que tinha como preceito básico e radical a liberdade de expressão, a atividade superoitista, assim como o vídeo77, foi amplamente praticada enquanto deslocamento do circuito tradicional da arte e dispositivo de democratização do meio audiovisual, também pelo seu fácil manuseio no processo de produção de filmes e pela despreocupação com a indústria cinematográfica. Da circulação também marginal, Torquato Neto diz sobre a bitola Super-8: “Pegue uma câmera e saia por aí, como é preciso agora: fotografe, faça o seu arquivo de filminhos, documente tudo o que pintar, invente, guarde. Mostre. Isso é possível” (Última Hora, 19/10/71). Além de ter sido utilizado como meio para discussão política, os artistas, com o objetivo de subverter os antigos padrões das artes plásticas (como a pintura para contemplação) e a representação do cinema de narrativa tradicional, enxergaram na bitola uma maneira de explorar novos discursos, experimentando novas possibilidades de expressão artística. Dessa forma, interagiram “com a precariedade do veículo, aderindo estudiosamente aos seus grãos, à sua textura” (MACHADO, 2001, p.9). Osfilmes de artista tinham como pressuposto o desprendimento com as técnicas cinematográficas, como a elaboração de roteiros, por exemplo, e trabalhavam com o registro de imagens em movimento articulado por uma intenção artística e não com fins de representação. Além disso, esses filmes eram demarcados pela experiência em diversas linguagens. Segundo Fernand Léger, artista e diretor do filme Ballet Mécanique (1924),

A história dos filmes de vanguarda é muito simples. É a reação direta contra os filmes de roteiro e estrelismo. É a fantasia e o jogo indo de encontro à ordem comercial dos outros. E isto não é tudo; é a revanche dos pintores e dos poetas. Numa arte como esta, onde a imagem deve ser tudo, há que se defender e provar que as artes da imaginação, relegadas a meros acessórios, poderiam sozinhas, por seus próprios meios, construir filmes sem roteiro, considerando a imagem móvel como personagem principal. (1989, p. 158)

Rubens Machado (2012a) destacou, entre a diversidade de discursos em Super-8 presente na década de 1970, os “documentaristas” e os “anarco- superoitistas”, sendo que este último grupo possui sua força no caráter experimental, que busca novas possibilidades de linguagem em cinema. Como forma de resistência social, registravam o que acontecia no momento (o aqui e agora), nas experiências individuais, sem criação de manifestos ou discursos de oposição ao sistema vigente.

Agrippina é Roma-Manhattan, que possui peculiaridades com o Cinema Marginal, ao mesmo tempo em que aponta marcas patentes com o Super-8, é filme que não segue uma narrativa lógica. Ao mesmo tempo, possui personagens exóticos que nos chamam a atenção mais pela própria performance do que pela sua interação com o espaço que os circundam, salvo a “postura de Agrippina no segundo bloco, solitária e sempre altiva, que perambula por uma larga esquina, num ir e vir ligeiramente sôfrego, sugerindo ao vento alguma disponibilidade” (MACHADO, 2010, p.19). A sexualidade da personagem de Cristiny Nazareth, atriz ivamp dos Super-8 rodados por Ivan Cardoso no Rio de Janeiro, é cheia de simbolismo e aproxima-se da performance e do caráter momentâneo da poesia marginal, “que se propunham transitórias, imediatas, mais ativas que representativas” (Idem, 2012a). Uma das características do Super-8 – e também do vídeo – da metade da década de 1960 e ao longo dos anos 1970 era a propensão para o registro de ações performáticas, pois estas iam de encontro com os padrões estabelecidos de bom comportamento em sociedade, principalmente uma sociedade regida pela ditadura militar. Dessa forma,

a performance estava seguidamente ligada à contestação da ordem imposta ao espaço público, como na “observação-ação” proposta por Peo, que quer “usar o espaço físico da rua reavaliando seu funcionamento e introduzindo novas atitudes” (Idem, 2012a)

No primeiro bloco, como já salientamos, a câmera de Oiticica filma com enquadramento vertical, e Agrippina se movimenta como um monumento, uma entidade quase que transcendental em meio a um ambiente formado por torres modernas e uma igreja neogótica. Depois, no segundo bloco, permeia-se pela sujeira das ruas mundanas, onde a câmera filma horizontalmente um cenário urbano, enquanto a atriz perambula por uma larga esquina de Wall Street. Vinculado à performance, o Super-8 tem como outra de suas práticas o ataque aos monumentos. Como ainda salienta Rubens Machado, a ‘desmonumentalização’ teve como principal propositor o artista, poeta, crítico e cineasta superoitista Jomard Muniz de Brito. Em seus filmes, assim como em Agrippina é Roma-Manhattan, “performances desmistificadoras contracenam com estátuas e prédios do patrimônio histórico” (MACHADO, 2012a). Oiticica parece brincar com esse preceito, ao envolver personagens como Cristiny Nazareth, o performer Mário Montez e o artista Antonio Dias em espaços cujas características não estão totalmente claras: uma Nova York mundana se traveste em uma Roma neoclássica e depois volta a ser mundana. Agrippina ela própria ora monumento, ora prostituta, passeia por agências bancárias de fachadas neoclássicas:

A força gráfica da cenografia emprestada pelas fachadas neoclássicas é construída pela câmera de Oiticica, que percorre conjunções de arquitraves e capitéis, suas severas vibrações no paralelismo horizontal dos degraus, conjugados às ranhuras verticais no fuste das colunas. (Idem, 2010, p.21)

Sob a égide do canto X “O Inferno de Wall Street” (d’O Guesa de Sousândrade), o filme revela uma Nova York que se transforma em Roma neoclássica, um vai-e-vêm do cotidiano e do mito, numa espécie de “tese, antítese e síntese” (Idem, 2010, p.22). Da verticalidade da arquitetura do primeiro bloco à horizontalidade banal e mundana do segundo, o terceiro bloco “restitui aos edifícios uma ordem fálica, mas rende-se ao jogo de dados mais empírico, no espaço público das ruas” (Idem, 2010, p.22). Assim, Hélio Oiticica revela uma Nova York mítica e, ao mesmo tempo, profana, que está entregue ao capitalismo e às negociações da bolsa de valores. Suas linhas de força possuem referências sólidas com o experimentalismo do Super-8 brasileiro e algumas de suas práticas, tais como: fragmentação da narrativa, registro de performance, explorando texturas e cores, e dessacralização de monumentos antigos.

 

3.2. Vídeo e Performance: a incorporação do outro na obra

Além do Super-8 e simultaneamente a alguns artistas norte-americanos78 do mesmo período, como Yoko Ono, Vito Acconci, Joan Jonas entre outros, na década de 1970 alguns brasileiros começaram a utilizar o vídeo como dispositivo para registro do próprio corpo em performance frente a uma câmera, trabalhando apenas com um plano e uma sequência. Na maior parte desses vídeos, o artista faz a mesma ação durante toda a fita. Em Marca Registrada (1974) a artista Letícia Parente registra, sem titubear, o momento em que borda “Made in Brazil” na planta de seu pé em close diante da câmera. Seria possível aludir às ironias políticas e às questões de gênero que podem ser nele levantadas, mas o que queremos destacar é que esse vídeo, sem cortes, é resultado de uma ação, uma performance de artista que faz o mesmo gesto, preciso, durante 10 minutos, sem interrupções. Diz Arlindo Machado sobre as obras que são produzidas nesse período:

Mesmo não apresentando uma concepção narrativa mais definida, que se apoiassem nas possibilidades discursivas da imagem e do som, tais obras já evidenciavam uma intertextualidade entre a ação performática do artista e esse aparato eletrônico. (2003, p. 10)

De maneira diferente, Hélio Oiticica experimentava o corpo do outro em performance, pois acreditava que se colocasse o próprio corpo em ação, levaria seu trabalho a um intimismo inapropriado, a uma ostentação egocêntrica. Lendo textos do livro Silence, de John Cage, Oiticica escreve: “música poema como algo utilizável como instrumento de um todo-performance q se estende como PERFORMANCE in progress e não como meia dúzia de bluffs e demonstração de meio-talenta numa ‘casa de espetáculo’” (PHO 189/73). A performance então é experimentada pelo espectador, que se torna ator e criador, pois é da sua relação com o espaço-tempo performático que se constrói a obra. Assim, mesmo em um espaço coletivo, onde inúmeras pessoas transitam, as possibilidades de criação são igualmente inúmeras, pois as experiências são individuais.

O corpo que participa: os quase-cinemas ambientais propostos por Oiticica “desarmam as classificações mentais prévias” (BENTES, 2002, p.141), incentivando criativamente o participante através de estímulos táteis, auditivos e visuais, resultando em uma obra que existe de forma única em quem a experimenta. Como é sabido, em quase-cinemas a experiência do participante não é condicionada por linhas narrativas. Através de um ambiente multissensorial – construído com imagens projetadas, música e elementos do cotidiano79 – o participante é convidado a interagir, estimulado por todos os lados a partir do momento em que adentra tais espaços. As pessoas podem andar pelo ambiente, deitar-se, lixar as unhas ou mesmo “nadar numa piscina com o corpo totalmente imerso em matérias que fluem: imagens, luzes e água”80.

Levando o corpo do antigo espectador em uma performance com o espaço- tempo modificado, Oiticica, em sua busca do “puramente experimental”, deixava de lado toda e qualquer forma de instaurar significados às práticas artísticas. A performance, para ele, era menos uma forma de expressão artística do que uma maneira de fazer desaparecer o espectador que contempla. Em texto-síntese sobre o Parangolé (PHO 0201/72), a capa, a dança, Oiticica traça um elo em direção à discussão do conceito de performance, do problema-limite do espectador em relação ao mundo-espetáculo, no qual ele seria ou performer- criador ou objeto-espectador, sendo que o performer-criador não deve representar mas praticar ação espontânea. Segundo Lisette Lagnado, no Brasil, essa forma de enxergar a performance (no outro) tem suas origens no teatro e na TV; mais especificamente, desde os anos 60, com as montagens do Teatro Oficina, liderado por José Celso Martinez Correa. Nas montagens das peças, o diretor objetivava transformar o público em participante. Nesse sentido, pontuou a autora: “essas experiências (de montagem) confluíram para acelerar o fim da dicotomia entre palco e plateia” (LAGNADO, 2003, p. 80). Como já foi discutido anteriormente, a televisão, devido à sua pouca definição visual, também era uma maneira de abrir “entres” para que o espectador se tornasse participante, criando imagens e pensamentos nas lacunas daquelas imagens não-definidas. O segundo ponto importante levantado por Lagnado, no que concerne a ideia de público-participante de Oiticica, foi o programa de auditório comandado por Chacrinha. Em 1968, Oiticica escreve, em uma carta, para Lygia Clark:

Fui ao programa do Chacrinha, servir de júri (…) a experiência foi genial. Chacrinha é realmente incrível, e, pela primeira vez, senti que o ‘público’, na plateia, é tão ator-participante quanto os que estão no palco. Há um calor comunicativo que me lembra o papel do coro na tragédia grega, que era o representante do povo, ou da coletividade, para os gregos, mas só que aqui a sublimação deles é outra coisa: é o deslanchamento da ação sem sublimação, ultraimprovisada, contando com o imponderável mesmo. (1998, pp. 76-77)

Finalmente, em terceiro lugar, Lagnado descreve o interesse de Oiticica com o grupo de teatro experimental off-Broadway The Living Theatre, cuja interação entre atores e plateia atraem o artista. Fundado em 1947, em Nova York, esse grupo estimulava a desobediência civil e lutava para abolir as fronteiras entre palco e plateia, objetivando aproximar a arte da vida. Segundo Oiticica, esses atores eram capazes de abolir a distância entre eles e o público e, assim, todos que estavam na plateia faziam as mesmas coisas que eles. Reitera Oiticica que, através da reinformação, essa plateia agiria de modo diferente também depois desse não-espetáculo, na sua “vida real”. Quando o artista buscava aproximar a arte e a vida, era sobretudo através desses desdobramentos da participação: a partir da multiplicidade, as pessoas que vivenciavam suas invenções ambientais coletivas saíam de lá diferentes, e agiam de maneira diferente no seu cotidiano.

 

3.3. Corpo-casa

O corpo inserido no contexto artístico é entendido aqui como parte de uma grande teia de conceitos, pensamentos e processos que podem ser operados pela obra de arte. Nesse sentido, o corpo é parte da obra indissolúvel da vida. O corpo individual encontra-se, dessa forma, expandido no coletivo dentro da acepção do trabalho artístico. Em geral, onde o corpo está vinculado as poéticas se mostram fragmentadas e múltiplas, ativando elementos de outros meios, como o vídeo, o cinema, o teatro e a dança.

Nesse contexto, Flávio de Carvalho foi um artista que, apesar de ter iniciado suas ações performáticas pelas ruas na década de 1930, as quais ele chamava de ‘experiências’ (como sua performance na rua Experiência no 2, em 1931), estava inserido dentro de uma linha do tempo que flui em direção aos movimentos de pós-vanguarda relacionados à potência do corpo na obra, como os que se conhece do final da década de 1960 e início de 1970. Isso é devido à sua grande inventividade, experimentalismo e, assim, marginalidade, pois, segundo Antonio Manuel, “Flávio de Carvalho extrapola seu tempo para encontrar-se com gerações futuras”81. Situado entre as poéticas do dadaísmo e do surrealismo e adentrando nos meios da dança e do teatro, o universo de experimentação de Flávio de Carvalho ficaram sempre à margem das instituições artísticas e das maneiras tradicionais de se fazer arte, como a pintura e a escultura. Vinculado entre a ética e a estética, entre a atitude do corpo e a obra de arte, pensou sobre a moda, a cultura e o corpo social, levando-o a criar e exibir, em 1956, o New Look – Traje Tropical (Experiência no 3), que se tratava de uma roupa masculina para ser usada no verão dos trópicos, cujo desfile-performance aconteceu pelas ruas do centro de São Paulo. A vestimenta compunha-se de uma minissaia pregueada, uma bata solta de tecido leve, sandália de couro baixa e meia arrastão. Integrando-se aos meios de comunicação da época, o desfile de lançamento do novo traje foi monitorado pela imprensa local82, fazendo com que o acontecimento fosse de grande repercussão nos jornais e na televisão. Porém, por conta da tecnologia ainda precária, não houve registro permanente da ação. Luiz Camillo Osório, ao analisar o diálogo das experiências de Flávio de Carvalho com A Casa é o Corpo, de Lygia Clark, e com as capas para vestir Parangolés, de Hélio Oiticica – que já era arte ambiental –, escreve:

Não seria exagero especulativo associar o Traje Tropical aos Parangolés de Hélio Oiticica. Entre um e outro há enormes afinidades. Ambos dão ao corpo potência poética, equacionam arte e vida, fazem da cidade e do seu fluxo transitório e precário alimento para suas experiências, veem na rebeldia um princípio de individuação, e, principalmente, assumem a criação artística como uma prática libertária. (2005, p.16)

De Lygia Clark, a obra-ambiente A Casa é o Corpo: Labirinto, de 1968, é uma estrutura em forma de labirinto que contém em seu interior uma bolha de plástico que faz as vezes de útero, abrigando os visitantes que lá penetram. É um entre-espaço cujo caminho é construído muitas vezes, e de maneiras diferentes a cada instante, pelo público participante. Esse trabalho, construído em labirinto porque “é totalidade espacial que sempre se renova e tensiona percurso, posição e apreensão do espaço”, inaugura o conceito do corpo-coletivo de Lygia Clark, que tem como premissa a ideia do corpo como arquitetura, da projeção do corpo na obra, já antes vivenciado por Flávio de Carvalho em suas experiências. A Casa é o Corpo faz reviver a experiência de se estar dentro do útero materno, abrigado. O nome e a estrutura-imagem “casa” articula a obtenção de outra significação, pois se reflete sobre o corpo individual, de onde emerge o coletivo, anunciando alguns dos símbolos que seriam depois praticados na arte contemporânea:

[…] a casa constitui o espaço fundamental das experiências socializantes, e como tal estabelece uma metáfora poderosa do “corpo coletivo” ou, do “corpo social” – uma simbologia que se faz muito presente na arte contemporânea. (VIEIRA, D.V., 2012, p. 3)

Nessa obra, ocorre a destruição do objeto em detrimento do insurgimento da corporalidade como estrutura principal das vivências-ambientais: um “mundo- abrigo”, tão bem conceituado por Hélio Oiticica. O coletivo, a princípio, se estrutura exatamente a partir da ação do corpo nos ambientes criados pelo artista, ação esta entregue ao experimental:

A emergência do que o Sartre chama de coletivo, é exatamente essa capacidade que as pessoas têm em poder entrar no estado de invenção, de experimentar, a capacidade de experimentar é o que pode fazer com que cada pessoa entre no estado de invenção e daí possa emergir uma coletividade. (OITICICA, AHO 2555.79, p. 80)

Merleau-Ponty descreve sobre essa relação entre o corpo e o espaço, mais precisamente da construção do espaço através do corpo e de suas ações, o “corpo-casa”83:

A experiência do corpo nos ensina a enraizar o espaço na existência. […] A experiência revela sob o espaço objetivo, no qual finalmente o corpo toma lugar, uma espacialidade primordial da qual a primeira é apenas o invólucro e que se confunde com o próprio ser do corpo. Ser corpo, nós o vimos, é estar atado a um certo mundo, e nosso corpo não está primeiramente no espaço: ele é no espaço. (1999, p. 205)

As propostas introspectivas e vivenciais de Lygia Clark e as abertas- ambientais de Hélio Oiticica, sobretudo as proposições do programa quase- cinemas, potencializam o cruzamento da arte com a vida, onde o corpo individual encontra-se amalgamado no coletivo, ativo através da “descoberta do corpo mesmo, não a do corpo como suporte” (OITICICA apud FAVARETTO, 1992, p. 182), expandido para uma estrutura arquitetural. Esse novo corpo se situa no imbricamento de alterações das antigas posições do espaço, do tempo e da relação da obra com o espectador. O espaço, antes representado bidimensionalmente, por exemplo, em uma tela, expande-se em direção ao campo das ações e interações humanas; o tempo para contemplação se altera para o tempo presentificado a cada instante vivido pelo participante; o espectador da obra de arte deixa de ser passivo para ser ator-atuante. Perpassando pela ética e pela estética, as propostas de Oiticica e Clark são constituídas, segundo David Sperling (2012), por três dimensões:

Uma dimensão ontológica situa a arquitetura, lugar vivencial transformável, como o espaço da existência humana; o espaço estruturado e aberto como único campo possível para a manifestação de uma dimensão política. Esta posiciona o espaço arquitetural – no sentido que propõem – como estrutura para uma vida coletiva ativa, de transformação da realidade vivencial, a qual passa necessariamente por uma dimensão estética ou perceptiva, de desabitualização das ações e do estar no mundo.

Através do corpo como elemento ativo para criação, os trabalhos de antiarte ambiental de Oiticica articulam elementos que se transformam a cada experiência do participante-criador: são espaços para se estar, estruturados com elementos diversos a serem manipulados: objetos, imagens em movimento, música. Através do comportamento do público que reage aos elementos oferecidos pelo artista, do seu exercício experimental da liberdade84, provém uma eterna construção de novos espaços, de novas arquiteturas, rejeitando a obra de arte acabada e enfatizando o processo. As palavras de Lygia Clark definem o que aqui se analisa: “A obra (de arte) deve exigir uma participação imediata do espectador e ele, espectador, deve ser jogado dentro dela.” (Clark, 1980, p. 16). Dessa forma, Oiticica, assim como Clark, imprime em seus percursos a superação da arte contemplativa, aquela da representação, para estruturarem, mais à frente, o pensamento de pós-vanguarda da década de 1970, o que reverberaria em algumas das práticas da arte contemporânea, nas quais estão embutidas as experiências da vida individual e coletiva como proposição da arte, em detrimento do olhar sobre uma imagem. Os trabalhos atuais de videoinstalação deflagram vários caminhos de criação por parte do público participante. Por meio de múltiplos ambientes e projeções de vídeos, os sentidos da vivência presentificada são mais importantes do que a obra finalizada, pois compartilham com o público o processo de significação do trabalho artístico.

 

3.4. Prenúncios da Videoinstalação

As primeiras instalações com vídeo são creditadas aos artistas do final da década de 1950 e durante os anos 1960. De acordo com Rush (2006), a arte da instalação teve início com as vanguardas sessentistas, que eram contrárias a instituições de arte, museus e galerias. Apesar disso, admiravelmente, ela foi bastante explorada dentro dos seus espaços expositivos. O mercado da comunicação em massa, ou seja, a visão unilateral, restrita da televisão broadcast, era o grande alvo de crítica desses artistas, que usavam o mesmo suporte para construírem suas instalações com vídeo. Assim, observamos que, nesse período, a construção dos ambientes videográficos era feita a partir da utilização de monitores de TV. Rush também afirma que Wolf Vostell e Nam June Paik foram os primeiros a usarem o vídeo fora dos estúdios televisivos. Como uma nova forma de expressão, Vostell prima por criar ações dentro de ambientes construídos, que são eventos para participação de todos. Em seu Manifesto What I Want, de 1964, escrito em detrimento do evento de arte da Aachen Tecnical University, na Alemanha, ele discorre sobre suas intenções:

…nenhuma diferença entre vida e arte/
…escapar não da mas na realidade/
…fazer do happening uma experiência sentida no próprio corpo/
…tornar-me cor, luz, tempo, matéria e pintura/
[…]
…tirar cada cena da vida cotidiana de seu contexto costumeiro e situá-las em um novo contexto/
…participação permanente em todos os procedimentos com os sentidos do toque, cheiro etc./
…caracterizar um evento através da soma de efeitos colaterais/
…arte como espaço, espaço como ambiente, ambiente como evento, evento como vida/ …viver arte e pensar arte/
…objetivo, sem objetivo, forma aberta, ausência de centro, conquista de um objetivo, sem foco/
…todos como performers ou executores no lugar de observadores ou ouvintes/ 85

No âmbito das experiências que aconteceram no Brasil, Christine Mello (2008, p.189) destaca três artistas que deram continuidade às práticas do vídeo, dando início aos procedimentos de expansão videográfica através da performance e de ambientes instalativos audiovisuais, conduzindo, dessa maneira, as práticas videográficas a novas formas de relacionamento: Flávio de Carvalho, Wesley Duke Lee e Hélio Oiticica. Em 1956, Flávio de Carvalho, artista-performer, levou ao jornal e televisão brasileiros a Experiência n.3 (New Look-Traje Tropical), tratando-se, portanto, de uma ação performática filmada, apesar de não haver registro permanente fílmico, apenas o fotográfico. Nesse trabalho, muito próximo ao happening, o artista experimenta ele próprio a performance, o que difere dos trabalhos de Oiticica e Duke Lee, onde o importante é a performance do outro, a experiência do outro. Dessa forma, de mais interesse para averiguar os primeiros sintomas de expansão do vídeo são as repercussões dos trabalhos ambientais de Wesley Duke Lee: O Trapézio ou Uma Confusão, de 1966 e Gaiola de Cadeiras, de 1967, que deram origem, pouco tempo depois, à videoinstalação O Helicóptero (1967-1969). Trata-se de um ambiente criado por um circuito fechado de vídeo, um espelho, pinturas, colagens, sons, luzes, cadeira de piloto, painel de controle de aeronave, etc., que foi “pensado como um meio de levar o espectador/ participante a uma viagem que o iluminaria sobre seu espaço interior” (COSTA, 2005, p.148). As imagens das pessoas que transitam pela instalação são refletidas no espelho e também são exibidas na tela da televisão, “lembrando a concepção de McLuhan de que o espelho e o vídeo representam diferentes ângulos de consciência: o sincrônico e o diacrônico” (Idem, loc.cit.). A obra de Wesley Duke Lee, desde as instalações mais simples até as mais complexas e tecnológicas, situam-se nos desdobramentos do futurismo, fazendo com que o artista se inspirasse nesta vertente para construir ambientes multimídia, através da união de diversos materiais e objetos que interviriam nas experiências sensoriais do público. As luzes e os sons de O Helicóptero e seus elementos cinéticos afetam a imaginação e distorcem a noção de tempo e lugar, abrindo outros mundos ao próprio participante.

Além desta instalação de Duke Lee, os trabalhos de arte ambiental de Hélio Oiticica, que se iniciaram com os Penetráveis (1960) e os Parangolés (1965) e que o levaram a criar, em 1967, o ambiente instalativo híbrido Tropicália – PN2 “A Pureza é um mito”, PN3 “Imagético”, deram início à construção dos ambientes midiáticos sensoriais que, então, fariam parte do seu processo de trabalho durante a década de 1970 – os quase-cinemas. Criado em 1967 e constituído por 2 Penetráveis (PN2 e PN3), além de plantas tropicais, papagaios, areia, brita, poemas objetos, ervas aromáticas e uma televisão de 14 polegadas ligada, em Tropicália Oiticica opera mecanismos do vídeo, do cinema experimental, da instalação ambiental e da participação sensorial do público: o “comportamento- corpo”, segundo sua própria definição.

 

3.5. Videoinstalação

Ao criar quase-cinemas, se desenvolve a ideia de supressão do objeto em prol de uma ação performática dentro de um espaço ocupado por imagens híbridas, objetos diversos e sons – o que Christine Mello (2008) chamou de “ambientes relacionais midiáticos”. Ele produziu lugares multissensoriais para performance do público. Assim como quase-cinemas, a videoinstalação é um dispositivo que compreende o corpo interagindo com o trabalho artístico – a incorporação na obra – onde o processo de criação (do artista e do público) toma o lugar da obra de arte acabada para contemplação. Esse processo artístico, com o fim de explorar o corpo e o pensamento, busca organizar o espaço de forma a torná-lo multissensorial, imagético. Com o fim de gerar sentidos no antigo espectador da obra de arte, trabalha-se com imagens do vídeo, atualmente em multiprojeção nas paredes (dando lugar aos antigos monitores colocados no espaço expositivo, da década de 1970), além de outros objetos, onde “a imersão é um princípio estético” (MELLO, 2008, p.170).

Diferente das salas de cinema, nas quais o público fica preso às suas poltronas, a videoinstalação é um espaço que promove a abertura do campo perceptivo onde o participante vive a obra, ao mesmo tempo em que ela faz insurgir nele suas próprias referências de vida. Dessa forma, se converte a “dinâmica de arte temporal – relativa à incrustação do tempo no código eletrônico – para uma dinâmica de arte espacial – relativa à disponibilização dos elementos sígnicos por todo o espaço físico do trabalho” (Op. cit., p. 173). Assim, usando a tecnologia do vídeo, a videoinstalação pressupõe a construção de uma pluralidade de espaços de arte, propondo ao espectador não apenas a apreciação visual, mas também o seu deslocamento no espaço e no tempo, que se torna presentificado, vivenciado a cada momento, pois “é no instante em que pratica o ato que o espectador percebe simultaneamente o sentido de sua própria ação” (CLARK, 1980). A videoinstalação se estabelece entre o espetáculo e a participação do outro, ao se observar imagens em movimento, ao mesmo tempo em que se transita pelo espaço e se relaciona com ele. Espaço constitutivo de ações, de movimento do corpo, de participação, mas também de construção de pensamento, pois atua nos sentidos e na percepção do participante. As palavras de Margaret Morse explicitam o que aqui se disse:

As artes da apresentação e, particularmente a videoinstalação, são formas de arte privilegiadas por colocar este ambiente mediatizado/construído em jogo com o propósito da reflexão. De fato, a premissa subjacente da instalação parece ser que a experiência audiovisual suplementada sinestesicamente pode ser um tipo de aprendizado não apenas com a mente isolada, mas com o próprio corpo. (1990, p. 158)86

No Brasil da década de 1950, 1960 e 197087, os procedimentos dos trabalhos com vídeos foram cunhados menos no suporte do que na efemeridade da experiência, na performance, no deslocamento do tempo e no processo em arte. No Catálogo da “Mostra de Arte Experimental de filmes Super-8, Audiovisual e Vídeo-tape”88, Anna Bella Geiger diz:

Não necessariamente me interessa precisar ou determinar a priori o desdobramento do meu trabalho comprometido com seus meios técnicos, mas sim em termos da ideia, do conceito, isto sim, fundamental para mim. Não me interessa enfatizar o uso desse ou daquele meio no sentido de uma identidade de caráter técnico- ideológico de minha obra com a arte. (2007, p.136)

Na atualidade, as videoinstalações também exploram os recursos de imersão para desfrute multissensorial do público. Em algumas delas, observa-se algumas das práticas utilizadas nos movimentos de vanguarda, mais precisamente com aquelas de Hélio Oiticica em quase-cinemas. Através de linguagens híbridas, mais precisamente no que se refere aos entre-fluxos do cinema com as artes visuais, ocorre, nesses trabalhos, a modificação do espaço através da construção de ambientes plurais cinematográficos com “abordagem da sensação, da imagem- afecção e a passagem da afecção aos afetos puros” (GOBATTO, 2009, p.16), a dilatação do tempo através da não-narração e a participação do outro na obra: o outro que a completa, parafraseando Duchamp.

No que concerne à poética, hoje a videoinstalação é um dispositivo que opera trânsitos com o outro, e seus procedimentos atuam entre o individual e o coletivo, estruturam-se na própria vida do público-participante, na sua realidade, mas também nos seus sonhos: “Expandem-se assim […] as fronteiras entre o documentário e a ficção, o visível e o sugerido, o vivido e o imaginado” (MELLO, 2008, p.183). O público, que vive no processo de criação, dá sentido à obra.

Trazer para a atualidade essas experiências de Oiticica significa, como nas palavras de Lisette Lagnado (2007, p.58),

tentar pensar o estatuto da imagem contemporânea, sua edição em plano-sequência, o lugar da projeção, a trilha sonora, as instruções para um jogo ou performance, “embaralhar roles”, nas palavras do artista. (13 de março de 1973)

Existem diversos tipos de abordagem que abrem caminhos para uma possível interpretação de sintomas similares nos quase-cinemas e nas videoinstalações produzidas hoje. No que se refere à exploração da imagem em espaços situacionais de interação com o público, destacaremos a videoinstalação Rua de mão dupla, de Cao Guimarães89, apresentada em 2002 por ocasião da XXV Bienal Internacional de São Paulo, cujo tema foiIconografias Metropolitanas. A invenção de Cao Guimarães é resultado de um trabalho de base documental, porém contaminado com práticas provindas das artes visuais: a fotografia, o vídeo e a instalação. Segundo Consuelo Lins,

[…] ele realiza assim uma espécie de documentário-jogo, no qual não se propõe mais a filmar “o mundo”, nem a interagir ou conversar com seus personagens, mas a estabelecer parâmetros de filmagem e regras específicas a partir dos quais imagens e sons podem – ou não – surgir.

Tendo como ponto de partida a investigação do outro, o artista propôs a três pares de pessoas – que moram sozinhas e que não se conhecem, a saber: um produtor musical e uma oficial de justiça, um construtor e um arquiteto, uma escritora e um poeta – a trocarem de casa, por 24 horas. Uma vez dentro da casa, deveriam filmá-la por dentro, os objetos que lá eram encontrados, tentando “! elaborar uma ‘imagem mental’ do outro(a) através da convivência com seus objetos pessoais e seu universo domiciliar”). Assim, cada pessoa descreveu suas opiniões sobre a personalidade do outro, de como o imaginaram, do ponto de vista do que presenciaram em sua casa. Em seguida, no espaço expositivo da Bienal, o artista apresentou as filmagens em três pares de monitores. A montagem se deu da seguinte forma: a tela do monitor, dividida ao meio, fazia com que o visitante observasse as filmagens das duas pessoas. No final, assistimos, ao mesmo tempo, as descrições e a pessoa descrita, que mostrava-se de frente para a câmera, “olhando” para o visitante da instalação, como se estivesse também ouvindo o retrato que a outra pessoa fazia dela. No que se refere ao caráter instalativo da obra, longe de tentar interpretar a realidade do mundo e deixar o espectador ter acesso a uma narrativa linear, a uma totalidade, a uma verdade, como aconteceria em um documentário tradicional, este trabalho oferece ao público um campo de possibilidades abertas aos pensamentos, por meio de imagens desconectadas instaladas no espaço expositivo:

Experiência colaborativa, sensória e vivencial de subjetivação, esse é o projeto conceitual de que a videoinstalação de Cao Guimarães se ocupa. Por isso ela é um ambiente, uma situação que requer trocas, intercâmbios, como uma verdadeira rua de mão dupla. (MELLO, 2008, p.188)

Ao buscar o mesmo processo de significação entre os ambientes híbridos de Cosmococas e os trabalhos de arte contemporâneos que imbricam particularmente cinema e arquitetura, Lisette Lagnado coloca em questão Cosmodrome (2001), de Dominique Gonzalez-Foerster. Na direção da busca de sentidos e distanciando-se da obra-objeto, este trabalho encontra-se no cruzamento do cinema com a construção de um ambiente imersivo, com forte referência ao espetáculo: “o Cosmodrome é entendido antes de mais nada como som e luz, entre obra de arte total e ambiente ‘gerador de sensação’” (FARINE, 2007)91. Trata-se de um ambiente construído no Arc, que é uma estrutura integrada ao Museu de Arte Moderna da Cidade de Paris (MAMVP), onde a artista frequenta intensamente e onde constrói instalações desde 1991, ao lado de outros artistas. Como no cinema, o visitante tem uma sessão (no caso, de 10 minutos), mas aqui ele experimenta um mergulho no espaço. Uma passarela é a porta de entrada para o novo universo. Quando adentramos no ambiente, ocorre um mergulho na escuridão total, os pés pisam em areia. Ao som da música eletro-pop de Jay-Jay Johanson surgem pontos brilhantes, constelações, de forma que a viagem intergalática, ou seja, a exploração do espaço (nos dois sentidos) acontece. Imagens, som-ambiente, modificação da sensação espaço-temporal, participação do público, o indivíduo no coletivo, características de procedimentos que levam, neste trabalho, à arte ambiental multissensorial. Segundo Lagnado, há em Cosmococas e Cosmodrome “[…] uma ideia de transporte metafórico para o mundo, esse ‘além’ do espaço expositivo: a imaginação é o veículo, a nave.” (2007, p.49). Em um sentido formal, esta videoinstalação se relaciona com quase-cinemas como blocos de sensações, que trazem a imbricação da experiência do corpo e da produção do pensamento através da modificação do espaço e da presentificação do tempo. Cosmococas e Cosmodrome possuem imagens não-narrativas em ambientes montados com multiprojeções. Espaços que transpõem o cinema tradicional e que produzem sentidos e significações no corpo de quem o experimenta.

 

4. Filme da autora: Gio-Gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual92

O cinema não é mera representação do mundo. O cinema produz realidade e (em todas as suas formas) possibilita uma experiência sensível, capaz de afetar nossos sentidos, nosso corpo e pensamento. (GOBATTO, 2009, p.311)

O estudo dos quase-cinemas somados a seu contexto e as relações com a videoinstalação contemporânea implicaram na construção de um pensamento em relação ao meu trabalho de instalação usando a tecnologia do vídeo. Na contemporaneidade, existe frequentemente a substituição dos objetos por ambientes instalativos que têm como proposta a exploração e interação no espaço, promovendo uma experiência do tempo presente. Tanto em quase- cinemas como nas linguagens artísticas/cinematográficas de sua época (que aqui foram investigadas), e na tentativa de construir um diálogo destes com o meu trabalho, ocorrem ambientes-eventos efêmeros, onde o acaso que provém da participação ativa é parte integrante da obra. Trata-se, sem dúvida, de eventos que não podem ser reproduzidos da mesma maneira, sendo que, a cada vez que acontecem, articulam-se de formas diferentes, como obras abertas a um campo infinito de possibilidades de ações e outros acontecimentos. Dessa forma, a aproximação da arte na própria vida vai além, pois também se insere num cotidiano específico, quando o visitante sai da obra diferente.

Nos trabalhos pesquisados, a instalação percorrida promove a construção de uma narrativa que mobiliza o corpo e a mente do participante. Pensando nesse tipo de apresentação, que Robert Morris chamou de “obras em situação”, questionei a importância das situações que se abrem, e que também são abertas pelos espectadores-participantes, provocando um efeito de duplicidade, uma via de mão dupla entre ele e a obra, onde o público é levado a pensar.

Dessa forma, a problemática se deu quanto às técnicas de multiprojeção e a prévia fragmentação das imagens através da montagem para que o deslocamento espaço-temporal do espectador pudesse acontecer. A decisão de criar um filme- instalação amparado por essas questões formais/estéticas, então, aconteceu de maneira natural porque houve a necessidade de dar continuidade ao meu trabalho de criação artística, cujos interesses concernem os procedimentos para a construção de videoinstalações.

O filme-instalação que foi feito no período de duração deste mestrado é apresentado como parte desta dissertação. Dos rebatimentos entre a criação e o pensamento teórico, deu-se o filme intitulado Gio-gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual. Neste filme instalativo, a partir da estratégia da montagem – imagens autônomas, múltiplas, cortes em close, planos fechados, embaçamento, diminuição da velocidade, etc. –, da multiplicidade das telas e do percurso pelo espaço, tentei erigir uma narrativa que se constrói na mente do visitante. O espectador do cinema, antes sentado imóvel em sua poltrona, ao lado de outras pessoas que também estão imóveis em suas poltronas, ele se transforma em um flâneur, alguém que caminha, que se move e se sensibiliza nesse outro espaço. Porém, ele não se sensibiliza somente porque foi construído esse dispositivo de criação, posto que a obra acontece quando ocorre a interação direta com o público; ele evoca e é constituído pela sensibilidade do corpo e da mente do participante, construindo experiências espaço-temporais e conexões imprevisíveis. De acordo com Merleau-Ponty, “[…] o sensível não pode ser definido como o efeito imediato de um estímulo exterior. […] a experiência sensível é um processo vital, assim como a procriação, a respiração ou o crescimento.” (1999, pp.31-33)

Através dos procedimentos ligados a suportes híbridos, que envolvem o som, o cinema e as artes visuais, o corpo da minha reflexão se forma por meio da criação de espaços cinematográficos para envolvimento corporal e sensitivo do visitante. Este processo se alimenta da imagem fragmentada, do tempo dilatado, do espaço modificado, ou seja, do insurgimento de um entre-lugar, como no entendimento de Cláudio Benito O. Ferraz:

O entre-lugar, portanto, é um conceito que aponta para um determinado arranjo espacial que se caracteriza por ser fronteira, ou seja, ao mesmo tempo em que separa e limita, permite o contato e aproxima. É local daqueles que estão de passagem e em movimento buscando os afetos e as razões para se enraizar e permanecer. É lugar de estranhamento e ao mesmo tempo potencializador de identidades. É onde se manifesta de forma mais dinâmica a diversidade de ideias e valores, por isso é propulsor de unidades de posturas. É o lugar cujo horizonte sempre está mais além e aquém, mas é também onde o vazio de significados cobra o estabelecimento de sentidos possíveis. É sombra e luz e algo mais. (2010, p.30)

No processo artístico deste filme, a metodologia utilizada requereu duas etapas: o primeiro momento consistiu em filmagem do objeto/tema escolhido. A intenção é de reconhecer o outro, embrenhar-se nos elementos que são ligados à existência, aos hábitos, fazeres e situações normais do cotidiano, mas também aos contextos dos sonhos, prazeres, obsessões, alegrias e tristezas, mesmo quando esses universos são fictícios; nesses casos, eles podem insurgir da minha vida particular.

A segunda etapa consistiu na edição e posterior exibição do filme. Sem interesse representativo tradicional e absorvendo elementos estéticos das questões e interesses acima citados, procurei explorar a não linearidade da narração através da pulverização das imagens, que são tidas aqui como vivas e recombinantes, como blocos de imagens, sons e situações que se justapõem à medida que são editadas. A proposta é construir um cinema que se expande no espaço, incitando a participação do público através da abertura do campo perceptivo, da presentificação do tempo e do objeto inacabado. Ao valorizar o processo, abre-se à multiplicidade do espectador: através de estímulos físicos e psíquicos, a intenção é de promover permanentes estados de invenção.

Título/Tempo/Ano de realização

Gio-gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual, 20’, 2012.

um odor de rebelião animal física imposta ao brilho das ruas
uma aurora sexual na ponte da Liberdade

                                                                                       (BESO, 2011, p.54)

 

Descritivo

O modelo é turbilhonar, num espaço aberto onde as coisas-fluxo se distribuem, em vez de distribuir um espaço fechado para coisas lineares e sólidas. É a diferença entre um espaço liso (vetorial, projetivo ou topológico) e um espaço estriado (métrico): num caso, ‘ocupa-se o espaço sem medi-lo’, no outro ‘mede-se o espaço a fim de ocupá-lo’.” (DELEUZE E GUATTARI, 1997, p.25)

 

Frame de Gio-Gio e Jaq-Lôca em: Uma aurora sexual.
Frame de Gio-Gio e Jaq-Lôca em: Uma aurora sexual.

 

 

Embrenhando-se em alguns aspectos da existência humana, o filme trata de uma mulher e um travesti que estão presentes em situações diferentes, sendo que, em cada situação, seus corpos se comportam de maneiras diferentes. O trabalho possui duas telas. A primeira tela é a do filme principal, que é dividido em três blocos-situações. A segunda tela possui imagens que se repetem e correm em loop. No filme principal, no primeiro e segundo bloco aparece uma mulher, caminhando nas ruas e na mata, ou dentro de casa, em afazeres domésticos. No início do primeiro bloco-situação, a mulher caminha, ora nas ruas mundanas de Campinas, passando em calçadas e lugares banais, do dia-a-dia, ora em ambientes inóspitos, em frente a fachadas de construções antigas, em meio a paredes velhas. Aqui, a intenção foi criar uma cidade fictícia, através da maneira de filmar e da utilização de filtros e sobreposição/manipulação de imagens. Em seguida, ela aparece em um ambiente florestal, com muitas árvores. Em quase todos os momentos desse bloco, ela se mostra carregando uma caixa de música, com referência ao mito de Pandora, a mulher de “todos os dons”:

Atena lhe ensinou as artes que convêm ao seu sexo, como a arte de tecer;
Afrodite lhe deu o encanto, que despertaria o desejo dos homens;
As Cárites, deusas da beleza, e a deusa da persuasão ornaram seu pescoço com colares de ouro;
Hermes, o mensageiro dos deuses, lhe concedeu a capacidade de falar, juntamente com a arte de seduzir os corações por meio de discursos insinuantes.
Depois que todos os deuses lhe deram seus presentes, ela recebeu o nome de Pandora, que em grego quer dizer “todos os dons” (CHALITA, 2004, p.26).

Quando Pandora abre a caixa, abre para o mundo todos os males e misérias humanas, deixando lá dentro apenas a esperança. A mulher desse filme brinca com isso: abre e fecha a caixa, de onde retira ou coloca objetos. Os objetivos são: jogar com a realidade e a ficção, a lucidez e a insensatez, a vida real e o sonho. Embrenhar-se nos aspectos ligados à existência: hábitos, fazeres, situações normais (ou não-normais, ou anormais) do dia-a-dia, as práticas repetitivas das pessoas, as obsessões da personagem, que pode ser real e imaginária (no sentido de “personagem” na raiz do latim “persona”: máscara, pessoa).

O segundo bloco começa com a mesma personagem em sua mais íntima situação, no interior de uma casa, possivelmente a sua, e lá permanece, sozinha e movimentando seu corpo: descascando frutas e legumes na cozinha. A mulher sempre parece, nos dois blocos, ora estar satisfeita em ser quem é e do que faz, ora anseia se afastar de um medo ou de um perseguidor invisível, ora paranoica em situação tensa. Na segunda parte deste bloco, a mulher desaparece e outra situação acontece, sendo a seguinte cena: duas pessoas, uma mulher e um travesti, uma conversa, um jogo de xadrez. Trata-se de uma apropriação do texto Um jogo de (anti) ilusões, de Rubens Pileggi Sá93, mas aqui em performance, formando a conversa entre a mulher e o travesti:

Durante uma partida de xadrez:
– Eu te digo isso: a arte é um travesti fazendo ponto em uma esquina suspeita no coração da noite triste. Seu nome é Mona. Mona Lisa. Ela te engana com seu sorriso enigmático, fingindo ser o que não é. Você sabe disso, mas se deixa levar pelo engano porque quer ser iludido. Precisa dessa ilusão. Mais, essa ilusão é a única realidade possível que você pode capturar. Ou pensa que pode. Porque, de fato, Mona Lisa não é de ninguém e ri o riso amarelo de quem tenta decifrá-la. (Movendo sua peça) Sua vez.
– Ora, meu amigo, agora você forçou a jogada. Como é que você pode descrever a arte assim, de maneira tão vulgar? Logo a arte, capaz de elevar nossa espiritualidade, de nos trazer prazer estético, tocar emoções, de nos fazer sentir o belo, de buscar ideais. (Olha o tabuleiro) Onde é que você jogou, mesmo?
– (Apontando com o dedo) Mas essa concepção é platônica, baseada em um mundo que não existe. Vivemos NESTE mundo e não em outro, o qual desejaríamos. E a beleza pode ser vista em tudo. Até no feio. Mas em Duchamp essa questão não vem ao caso. O deslocamento produzido por ele na arte leva em consideração a questão da realidade e da aparência como um jogo. Jogou?
– E você quer dizer o quê com isso? Que uma mentira pode valer por uma verdade?
– Pelo menos para aquela arte que nos fala o filósofo “como única força superior contraposta a toda vontade de negação da vida”, “que é mais forte do que o pessimismo, mais ‘divina’ do que a verdade”, sim. Minha vez.
– Lá vem você citando Nietzsche… (Concentra-se nas peças) Pode jogar.
– Quando Duchamp, em 1919, interfere em uma reprodução da Mona Lisa, ao colocar bigode e escrever as letras L.H.O.O.Q., que, em francês, soa mais ou menos como “ela tem fogo no rabo” – brincando com o fato de que ela seria um homem que teria posado para da Vinci – não seria exatamente sobre essa “mentira”, ou sobre esse engano, que ele estaria falando?
– Aquilo é uma palhaçada. Brincadeira de criança. Onde já se viu, colocar um bigodinho em uma reprodução de arte e isso ser considerado como, sei lá, arte, também. (Olhando para o companheiro) Não vai jogar, não?
– Vou, claro! Mas perceba que o gesto de deslocamento criado foi fundamental para que a arte tivesse algo a dizer, ainda. Ao negar, ele afirma. Ou melhor, ele nega afirmando sobre todos os conceitos que até então se tinha de arte. E depois é bom não se esquecer de que isso ocorre em um contexto de guerra mundial, partindo da experiência do movimento Dadaísta, etc.
– Banal!
– Banal, anti-ideal, anti-ilusório. Há prazer também na destruição criativa. Principalmente quando no lugar da ilusão, aparece outra, travestida de ilusão. Uma Rrose Sélavy, que é, ao mesmo tempo uma ilusão e uma desilusão.
– Aquelas fotos em que ele aparece travestido de mulher? Uma simulação, isso sim. (levantando rápido uma peça do adversário) Ei, presta atenção, perdeu seu bispo!
– Quem é que precisa dessa “máquina celibatária?” (ri) Xeque!
– É a vida! (resigna-se diante do iminente fim da partida).
– (Eros) c ́est la vie! Como poderia se interpretar, também.
– E o que resta, se nem a cópia é original?
– Só o xeque-mate.
– Ok, você venceu! (cai o pano).

Nessa parte, a intenção é, através da interpelação da mulher, a de mostrar a discussão da relação da arte com a vida real, e qual a definição da arte nesse contexto. O travesti é a própria mídia, a própria arte que ele se propõe a discutir com a mulher. Ela tem como ideia que a arte deve existir para mera contemplação, para o desfrute do que é belo, conceito que caiu por terra há muito tempo, certamente desde os movimentos de vanguarda histórica e, revitalizados, nos pós- vanguarda da década de 1960. Quando ele cita Duchamp e o dadaísmo, evoca a antiarte, ou seja, a indissolução da arte com a vida. O travesti, como se coloca a arte contemporânea frente ao modernismo, vence a disputa.

O terceiro bloco, deslocado dos outros, mostra o corpo de um travesti em performance. Ele perambula pelas ruas, assim como o fez a mulher no primeiro bloco. Aparece em situações comuns, mudo, em frente à agência de bancos, em bares. A projeção dos três blocos-situações e de uma fotografia de Rrose Sélavy94 formam um filme que será exibido em paredes dispersas. O ambiente é articulado através da modificação do espaço, dilatação do tempo e da participação das pessoas que visitam o espaço expositivo. As imagens são apresentadas de maneira a não seguir uma narrativa tradicional: trata-se de imagens-conceitos lançadas em ambientes plurais, onde o tempo é vivenciado no instante, resultando na inserção do público como parte da significação da obra. A obra, portanto, se definiu na construção das relações entre espaço, tempo, luz e participação do público.

A apresentação deste trabalho ocorreu juntamente à Defesa de Dissertação, na “Galeria da Casa do Lago” da Unicamp. Houve também uma mostra no espaço expositivo do Ateliê Aberto, localizado em Campinas-SP (dia 13 de setembro de 2012, às 16h e 19h).

 

Especificações do filme

1. Obra, ano de sua realização, duração, formato e forma de exposição: Gio-gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual, / 2012 / 20’/ mov. / projetado em 2 paredes. 2. Áudio: Os três blocos possuem som captado do ambiente onde ocorreram as filmagens.

 

Considerações Finais

Esse estudo iniciou-se com a investigação das práticas do programa quase- cinemas de Hélio Oiticica, cujas experiências foram acompanhadas por uma intenção artística e análise acerca do cinema, o que o fez construir seu programa de invenção em um campo rico de suportes. Oiticica, que procurava a destruição do objeto em detrimento da contemplação em museus e galerias, quando se deparou com a linguagem do cinema, em concordância com o cinema experimental, teve como estratégia a fragmentação da narrativa, a fim de subverter o dispositivo do cinema tal como ele é praticado até hoje: os espectadores, estáticos, sentados em poltronas e contemplando uma história de narrativa linear. Buscava-se, assim, outros agenciamentos capazes de promover no público outras formas de percepção/pensamento. A estética de quase-cinemas vincula-se a uma ética que tem como intenção deixar de lado os valores tradicionais do cinema e das artes plásticas para incitarem nos corpos os sentidos, a emoção, e também o pensamento, fazendo com que ocorressem mudanças na vida do participante e, assim, ele sairia da obra-experiência diferente, exatamente porque participou ativamente dela: “ser por si mesmo o eterno prazer do vir-a- ser” (NIETZSCHE, 2000, p.89, grifo do autor).

O conceito de não-objeto de Ferreira Gullar – e tão utilizado por Oiticica – se encaixa perfeitamente para explicitar o que o artista visionava: o fim da pintura e dos outros meios tradicionais das artes, a fim de invadir o espaço por meio de um outro tempo, o da vivência e do prazer. Dessa forma, pôs fim à representação e estimulou a experiência coletiva e o lazer criativo:

Não ocupar um lugar específico, no espaço ou no tempo, assim como viver o prazer ou não saber a hora da preguiça, é e pode ser a atividade a que se entregue um ‘criador’. (OITICICA, PHO 0367/69)

Ao desmaterializar o objeto, o artista criticou os suportes recorrentes das artes plásticas. Ademais, discutiu o conceito de plágio tal como o compreendiam os artistas que produziam obras acabadas em si mesmas, com o único fim de contemplação. As Cosmococas, por exemplo, apropriam-se de imagens de jornais, livros, capas de discos de vinil, etc., para, em seguida, inová-las. Para esta inovação da imagem, aplicou sobre elas, como matéria-prima, o pó da cocaína. Iconoclasta, Oiticica ridicularizou a soberania das imagens, dos artistas e suas obras. Através de sua antiarte ambiental, deslocou a arte a outros níveis, a saber: fundou espaços sensoriais através de ambientes plurais – multi-projeção e objetos variados – almejando o corpo em performance, e deslocou a percepção espaço-temporal do participante. A fotografia, usada para questionar a linearidade da narrativa, é colocada como um momento-frame. Os slides são projetados de forma a dar a sensação de movimento, o que acentua o caráter exploratório desses trabalhos. Surgem, assim, novas relações entre as imagens e o visitante.

Esses procedimentos são encontrados hoje na arte contemporânea e, assim, surgiu o interesse de pensar qual poderia ter sido a contribuição de Hélio Oiticica para o desenvolvimento das práticas híbridas das videoinstalações produzidas atualmente. Portanto, o estudo dos quase-cinemas teve como horizonte chegar a um quadro comparativo entre suas propostas e os conceitos e fazeres encontrados na videoinstalação, um dispositivo que domina a cena da arte contemporânea. Porém, ao longo do caminho, foi percebido que os quase- cinemas possuem particularidades que se estabelecem através do uso dos seus materiais, da serialização justaposta dos slides, da independência dos seus blocos, do processo de criação que valoriza a inovação e do caráter iconoclasta dessas práticas. Seu processo se estabelece autônomo em relação ao que se seguiu no cenário da arte, apesar das várias similaridades de procedimentos encontradas. O cinema usado como instrumento de Oiticica possui alguns sintomas dos dispositivos utilizados como estratégia narrativa que permeiam a produção da videoinstalação atual, mas é preciso precaução ao compará-los.

Ao aproximar quase-cinemas e a videoinstalação atual, procurei, a partir dessa análise, construir uma reflexão teórica em torno da minha ação criadora, refletindo sobre o lugar em que ela ocupa dentro da videoinstalação contemporânea. Então, o meu processo de criação, o entre-fluxos das imagens e ideias que não aparecem na tela, acontece a partir da imersão física e cognitiva das pessoas que participam da experiência videográfica, esta com manipulação prévia de imagens, porém que não resultam em objeto acabado. Para instalar o filme realizado, pensei na maneira como deslocar o espaço habitual para um espaço de experiência coletiva. Além disso, o processo de montagem das imagens captadas tinha como objetivo resultar em imagens que são autônomas, que não estão conectadas a uma narrativa linear; ao contrário, as narrativas aqui apresentadas são fragmentadas, mesmo aquelas pertencentes ao mesmo bloco- situação. Essas imagens transformadas são sensíveis ao pensamento, ao movimento do corpo.

Através da articulação das linguagens do cinema, da literatura e das artes visuais, o espírito é o de desbravar o campo da arte e do cinema que se relaciona com o mundo, com a realidade urbana, e com a natureza, sobretudo também com a imaginação. Isso porque a percepção ao cinema e à arte não precisa se dar através de um entendimento racionalizado; este pode insurgir por outra forma, mais subjetiva, de intuição, sensorial. Os procedimentos explorados no meu filme- instalação não se encerram no dia da Defesa de Dissertação. Assim como em quase-cinemas, trata-se de uma investigação in progress, os caminhos estão abertos a um campo de novas ações, relações e invenções.

 

 

 

 

Momento-frame’ de Gio-gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual.

Momento-frame’ de Gio-gio e Jaq-lôca em: Uma aurora sexual.
Fotografia de Maíra Costa Endo/ abril 2012.

 

uma grande salva de palmas ao mundo que admira a roupa invisível do rei. ao mundo das festas cheias de gente vazia. ao mundo da tolerância fingida, da amizade interessada e disfarçada, da risada mentirosa. um brinde ao mundo do dinheiro, do facebook, da religião, da mídia, da imagem. um brinde ao mundo da submissão, do metrô lotado, do sexo, da palavra maquiada, da literatura fajuta. ao mundo da droga, da fantasia, da perfeição almejada, dos títulos. um brinde ao mundo das vernissages, da obra de arte contemplativa, da moda, da polícia, da repressão. um brinde ao seu mundo. ao meu mundo, ao nosso mundo, para o qual meus olhos ainda se esforçam em abrir. quero apenas acordar e perceber que alguma coisa ainda pode mudar. ainda que eu tenha que pedir licença pra viver, peço. e vivo. vivamos. (Lucas Guedes)

Referências Bibliográficas

Textos de Hélio Oiticica:

AHO – Arquivo HO, Rio de janeiro: Projeto HO, 2006.
PHO – Programa HO, LAGNADO, L. (ed.) São Paulo: Itaú Cultural; Rio de Janeiro: Projeto HO, 2002, disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia/ho

OITICICA, H. Cor, Tempo e Estrutura, sem data, c. 1960. AHO 015.60.
__________Posição Ética, 1966. AHO 253.66.
__________À Busca do Suprassensorial, 1967. PHO 192/67.
__________A Criação Plástica em Questão: Respostas, 1968. AHO 0159.68 e PHO 0159/68.
__________Sem título, 1968. Título atribuído em AHO: Critério para o Julgamento das Obras de Arte Contemporânea. AHO 133.68.
__________A obra, seu caráter objetal, o comportamento, 1968. AHO 160.68.
__________Barracão, 1969. PHO 0440/69 e AHO 452.69.
__________Tropicália: the image problem surpassed by that of a SYNTHESIS, 1969. AHO 0350.69.
__________Tropicália, the New Image. AHO 0535.69.
__________As possibilidades do Crelazer, 1969. AHO 0305.69.
__________Barracão Idea, 1969. AHO 1664.69
__________The Senses Pointing towards a New Transformation, 1969. PHO 0486.69.
__________Londocumento, 1969. AHO 304.69
__________Subterrânia, 1969. AHO 382.69.
__________Subterrânia 2, sem data. AHO 382.69-a-pl.
__________Sem título, 1969. (Título atribuído em Aspiro ao Grande Labirinto: “LDN”). PHO 0384/69.
__________Experiência Londrina – Subterrânea, 1970. AHO 0290.70.
__________Brasil Diarreia, 1970. Título atribuído em AHO: Meu trabalho é subterrâneo. AHO 307.70.
__________Anotações para serem traduzidas para inglês: para uma próxima publicação, 1971. PHO 0271.71.
__________Subterranean Tropicalia Projects, 1971. AHO 269.71.
__________Projects, 1971. AHO 266.71.
__________Notas, 1971. AHO0278.71-pl.
__________Experimentar o Experimental, 1972. PHO 0380/72.
__________Hommage to my Father, 1972. AHO 451.72.
__________Parangolé Síntese, 1972. AHO 201.72.
__________Yoko Ono and Grapefruit, 1973. AHO 0292.73 e PHO 189/73.
__________ntbk 1/73, 1973. PHO 316/73.
__________ntbk 2/73, 1973. PHO 189/73.
__________Rap in Progress, 1973. PHO 0393/73.
__________Cosmococa: as drafted and synthetized for inclusion in Newyorkaises, outubro/1973 a fevereiro/1974. PHO 0311/73.
__________Ubercoca, 1973. AHO 0267.73-p2.
__________Mundo-Abrigo, 1973. AHO 194.73.
__________Cosmococa – programa in progress, 1974. AHO 0180/74
__________Carta para Waly Salomão, 23/01/1974. AHO 318.73.
__________Branco no Branco, 1974. PHO 0148/74
__________Vendo um filme de Hichcock, ‘Under Capricorn’, 1974. PHO 0318/74.
__________Texto feito a pedido de Daisy Peccinini como contribuição para uma publicação sobre o objeto na arte brasileira nos anos 60, 1977. PHO 101/77.
__________O Outro lado do Rio, 1978. PHO e AHO 0092.78.
__________Anotações sobre o Ready-constructible, 1978. PHO 0088/78.
__________Anotações Conta-Gota (para livro de Antônio Manuel sobre o corpo e implicações na arte, etc.), 1978. AHO 0091.78.
__________O q faço é MÚSICA, 1979. AHO 057.79.
__________À busca do suprassensorial. PHO. Tombo: 0192/67.
__________MANGUE BANGUE, de Neville d’Almeida, 1973. PHO 0477/73.
__________CC1 TRASHISCAPES, 1973. PHO 0300.73.
__________CC2 ONOBJECT, 1973. PHO 0443/73.
__________CC3 MAILERYN, 1973. PHO 0444/73.
__________CC4 NOCAGIONS, 1973. PHO 0445/73.
__________CC5 HENDRIX-WAR, 1973. PHO 0058/73.
__________CC6 COKE * HEAD’S SOUP / – a parody / GOAT’S HEAD SOUP, 1973. PHO 0318/73.
__________CC8 MR. D ou D DE DADO, 1973. PHO 0318/73.
__________SÉRIE DILMEN MARIANI 2 / CRELAZER, 1969. PHO 0367/69
__________PARANGOLÉ-SÍNTESE, 1972. PHO 0201/72.
__________NEYRÓTIKA, 1973. PHO 0480/73.
__________DE HÉLIO OITICICA PARA BISCOITOS FINOS, 1979. AHO 0057.79.
__________Sem Título, 1976. PHO 0173/76.
__________ESQUEMA GERAL DA NOVA OBJETIVIDADE, 1966. PHO 0110/66
__________Ivan Cardoso entrevista Hélio Oiticica, 1979. AHO 2555.79.

Textos e entrevistas de Hélio Oiticica consultados em publicações:

OITICICA, H. Experimentar o Experimental. Navilouca. Rio de Janeiro, 1972.
__________Parangolé: da antiarte às apropriações ambientais de Oiticica. GAM, n. 6, Rio de janeiro, maio 1967.
__________Aspiro ao Grande Labirinto (organizado por Waly Salomão, Lygia Pape e Luciano Figueiredo). Rio de Janeiro: Rocco, 1986.
__________& CLARK, L. (Organização Luciano Figueiredo). Lygia Clarck– Hélio Oiticica: Cartas – 1964-1974. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1998.
__________Entrevista a Ivan Cardoso (1979). IN: LUCCHETTI, R. F., CARDOSO, I. Ivampirismo: o cinema em pânico. Rio de Janeiro: Ed. Brasil- América, Fundação do Cinema Brasileiro, 1990. 374p.
__________O q faço é Música. Nova York, 1971. Reproduzido em Catálogo Galeria de Arte São Paulo, março de1986.
__________Bloco-Experiências in Cosmococa. Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996.
__________Notas. Folha de S. Paulo, 25/01/1986.
OITICICA FILHO, C. e VIEIRA, I. (orgs.). Encontros: Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Azougue, 2009.

Livros e Textos sobre Hélio Oiticica:

BASUALDO, C. Quasi-Cinema: Hélio Oiticica. Kunstverein, Colônia: New Museum of Contemporary Art, 2002.
Hélio Oiticica, Paris, 1992. (Galerie Nationale du Jeu de Paume, 10 juin – 23 août 1992).
BRAGA, P. Fios Soltos: a arte de Hélio Oiticica. São Paulo: Editora Perspectiva, 2007.
__________ Hélio Oiticica: simultaneidade, consequência e retorno. Prêmio Estudos e Pesquisas sobre arte e economia da arte no Brasil, Bienal de São Paulo, 2010. Disponível em: www.bienal.org.br/FBSP/pt/ProjetosEspeciais/ Projetos/Documents/Paula_Braga.pdf. Acesso em: 29 abr. 2012.
BRETT, G. O exercício experimental da liberdade. In: Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Rioarte, 1996.
CAMPOS, H., Depoimento a Leonora de Barros. In Hélio Oiticica (Catálogo Galerie Nationale Jeu du Paume Hélio Oiticica). Paris, 1992.
CANONGIA, L. Quase Cinema: Cinema de Artista no Brasil, 1970/80. Rio de Janeiro: Funarte, 1981. (Coleção Arte Brasileira Contemporânea – Caderno de textos).
CARNEIRO, B.S., Cosmococa – programa in progress: heterotopia de guerra, in Seguindo Fios Soltos: caminhos na pesquisa sobre Hélio Oiticica. BRAGA, P. (org.). Revista do Fórum Permanente. Disponível em: www.forumpermanente.org.
CÍCERO, A. Hélio Oiticica e o Super moderno. In: Arte Contemporânea Brasileira. BASBAUM, R. (org.). Rio de Janeiro: Contracapa Ed., 2001.
DACOSTA, C. Hélio Oiticica e a morte do cinema. In Revista do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais EBA – UFRJ, n. 6, 1999.
FAVARETTO, C. F. A invenção de Hélio Oiticica. São Paulo: Edusp, 1992.
__________Inconformismo social, incorformismo estético, Hélio Oiticica. In Fios Soltos: a arte de Hélio Oiticica. BRAGA, P. (org.). São Paulo: Perspectiva, 2007.
__________Por que Oiticica. In Por que Duchamp. BOUSSO, D. (org.) São Paulo: Paço das Artes/Itaú Cultural, 1999.
HÉLIO OITICICA. Paris: Galerie Jau de Paume. (catálogo da exposição Hélio Oiticica no Witte de With, Center for Contemporary Art, Rotterdam, 1992; na Galerie Nationale Jau de Paume, Paris, 1992; na Fundació Antoni Tàpies, Barcelona, 1992; no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1993; no Walker Art Center, Minneapolis, 1993-94)
JUSTINO, M.J. Seja marginal, seja herói: modernidade e pós-modernidade em Hélio Oiticica. Curitiba: Ed. da UFPR, 1998.
LAGNADO, L. Crelazer, ontem e hoje. In Caderno SESC_Videobrasil, Associação Cultural Videobrasil, no 3, p. 50-59, São Paulo, 2007.
LOUZON, E. Confidences de Júlio Bressane. AHO 2524.92.
MACHADO, R. Agrippina é Roma-Manhattan, um quase-filme de Hélio Oiticica. In Revista OITICICA: a pureza é um mito. 2010, vol.1, pp.18-23. Disponível em: http://issuu.com/itaucultural/docs/oiticica. Acesso em 2 mai. 2012.
OSORIO, L.C. As cores e os lugares em Hélio oiticica: uma leitura depois de Houston. ARS (São Paulo) [online]. 2007, vol.5, n.10, pp. 26-31. ISSN 1678-5320.
PEDROSA, M. Arte ambiental, arte pós-moderna, Hélio Oiticica. In: Correio da Manhã, 26/06/1966.
PIGNATARI, D., Hélio Oiticica e a Arte do Agora, Código no.4, Salvador, ago. 1980.
SALOMÃO, W. Hélio Oiticica: qual é o parangolé e outros escritos. Rio de Janeiro: Relume – Dumará, 1996.
SPERLING, D. Corpo + Arte = Arquitetura. As proposições de Hélio Oiticica e Lygia Clark. In BRAGA, P. (org.) Seguindo Fios Soltos: caminhos na pesquisa sobre Hélio Oiticica. Edição especial da Revista do Fórum Permanente (www.forumpermanente.org) (ed.) Martin Grossmann.

Teses sobre Hélio Oiticica:

BRAGA, P. A Trama da Terra que Treme: Multiplicidade em Hélio Oiticica. 2007. 210f. Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 2007.
DWEK, ZIZETTE L. Hélio Oiticica: O Mapa do Programa Ambiental. 2003. 217f. Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 2003.
GOBATTO, M.R. Entre Cinema e Videoarte: Procedimentos disjuntivos de montagem e narrativas sensoriais. 2007. 327f. Tese (Doutorado em Artes Visuais) – Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, Porto Alegre, 2009.

Revista Virtual sobre Hélio Oiticica:

Revista Oiticica: A Pureza É um Mito, 2010. Disponível em: http://issuu.com/ itaucultural/docs/oiticica. Acesso em: 04 mai. 2012.

Filmes e Áudios Consultados:

OITICICA, H. Entrevista a Ivan Cardoso, 1979.
__________Heliotape. OITICICA Fo, César (org.). Rio de Janeiro: Projeto HO. Transcrição em PHO 0503/74.
__________e CAMPOS, H., 1971. Heliotape. OITICICA Fo, César (org.). Rio de Janeiro: Projeto HO. Transcrição em PHO 396/71.
__________e VERGARA, C., 1973. Heliotape. OITICICA Fo, César (org.). Rio de Janeiro: Projeto HO. Transcrição em PHO 0504/73.

Outras obras e textos consultados:

ADORNO et al. Teoria da cultura de massa. LIMA, L.C. (org.). Rio de Janeiro: Saga, 1969.
AMARAL, A. Aspectos do não-objetualismo no Brasil. In: PECCININI, D.V.M.(org.) ARTE novos meios/ multimeios – Brasil 70/80. São Paulo: Fundação Armando Álvares Penteado, 1985.
BELLOUR, R. Entre-imagens. São Paulo: Papirus, 1997.
BENTES, I., Vídeo e Cinema: Rupturas, Reações e Hibridismo. In Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo: Itaú Cultural, 2003.
BESO. Almas Elétricas. São Paulo: Editacuja, 2011.
BRETON, A. Manifesto do Surrealismo (1924). Disponível em: www.culturabrasil.pro.br/zip/breton.pdf. Acesso em: 18 Ago. 2012.
BRETT, G./MACIAL, K. Brasil Experimental – Arte/Vida: Proposições e Paradoxos. Rio de Janeiro: Contra Capa/Rios ambiciosos, 2005.
CANTONI, R. Videoinstalação? Conheça melhor esta linguagem (que já foi para o espaço): Discussão sobre o percurso da linguagem e reflexão sobre a obra do artista Antoni Muntadas. Contatos com Arte e Tecnologia, agosto a setembro 2004. Programação paralela à exposição Emoção Art.ficial 2.0. Disponível em: www.itaucultural.org.br/educacao/download/video_instalacao.pdf
CHALITA, G. Vivendo a filosofia. São Paulo. 2004.
CLARK, L. Lygia Clark. Textos de Ferreira Gullar, Mário Pedrosa e Lygia Clark – Coleção Arte Brasileira Contemporânea, Rio de Janeiro: Funarte, 1980.
COSTA, C.T. Wesley Duke Lee: um salmão na corrente taciturna. São Paulo: EdUSP, 2005.
CRUZ, N. V. Nem cubo branco, nem sala escura: cinema expandido e a questão do espaço expositivo. In: 13o. Socine, 2009. 13o Encontro Socine, 2009.
CRUZ, R. (org.) Cinema Sim – narrativas e projeções. São Paulo: Itaú Cultural, 2008.
DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil Platôs. Capitalismo e Esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1997.
DEWEY, J. Últimos Escritos, 1925-1953. Arte como Experiência. (Org) Jo Ann Boydston. (Trad.) VERA RIBEIRO. São Paulo: Martins Fontes, 2010. 648p. DUARTE, P. S. Anos 60 transformações da arte no Brasil. Rio de Janeiro: Campos Gerais, 1998.
DUBOIS, P. Cinema, vídeo, Godard. São Paulo: Cosac & Naif, 2004.
__________O Ato fotográfico. Campinas: Papirus, 1994.
DUCHAMP, M. O ato criador. In BATTCOCK, G. A nova arte. Trad. Cecília Prada e Vera de Campos Toledo. São Paulo: Perspectiva, 1975.
FARINE, M. Cosmodrome…entre œuvre d’art totale et environnement “générateur de sensation”. Disponível em: http://www.lejournaldesarts.fr. Acesso em: 11 Jul. 2012.
FAVARETTO, F.C. Deslocamentos: entre a arte e a vida. In Deslocamentos na Arte (deslocamentos na experiência estética), Ouro Preto, Minas Gerais, p. 65-76, 20-23 out. 2009. Disponível em: http://abrestetica.org.br. Acesso em: 23 abr. 2012.
FERRAZ, C.B.O., Entre-Lugar: Apresentação. In Entre-Lugar. Dourados, MS, ano 1, n. 1, p. 15-31, 1o semestre de 2010.
HIGGINS, H. Fluxus Experience. University of California Press, Berkeley and Los Angeles, 2002.
KONDER, L. O que é dialética. 25a ed. São Paulo: Editora brasiliense, 1981.
LÉGER, F. Funções da pintura. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Estúdio Nobel, 1989.
LIMA, M. A. Marginália, arte e cultura na idade da pedrada. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2002.
LINS, C. Rua de Mão Dupla: documentário e arte contemporânea. In MACIEL, K. (org.). Transcinemas. Rio de Janeiro: Contracapas, 2009. Disponível em: www.videobrasil.org.br/ffdossier/Ruademaodupla_ConsueloLins.pdf.
LUCINDA, T.V., ALVARENGA, N.A. Um Cão Andaluz: lógica onírica, surrealismo e crítica da cultura. Artigo apresentado ao GT de Audiovisual do XII Congresso de Comunicação Região Sudeste, São Paulo, 2007.
MACIEL, K. (org.). Transcinemas. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2009.
MACIUNAS, G. Manifesto Fluxus, 1963. O que é Fluxus? O que não é! O porquê. Brasília e Rio de Janeiro/ Detroit: Centro Cultural do Banco do Brasil/ The Gilbert and Lila Silverman Collection Foundation, 2002.
MACHADO, A. A arte do vídeo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1990.
__________Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro, São Paulo: Iluminuras: Itaú Cultural, 2007.
__________Pré-cinemas & pós-cinemas, Campinas, SP: Ed. Papirus, 1997. MACHADO, R. MACHADO JÚNIOR, Rubens L. R. . Marginália 70: o experimentalismo no Super-8 brasileiro. 1. ed. São Paulo: Itaú Cultural, 2001. v. 1. 48p.
__________O cinema experimental no Brasil e o surto superoitista dos anos 70. In Axt, G. Schüler, F. (orgs.) 4Xs Brasil: itinerários da cultura brasileira. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2005.
__________Sobre a Dimensão Política do Experimentalismo Superoitista. Itaú Cultural: Panorama do Super 8, Cinema e Vídeo. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia/cinema/index.cfm? fuseaction=de talhe&cd_verbete=5247>. Acesso em: 2 mai. 2012a.
__________Super-8 e a Poesia Marginal. Itaú Cultural: Panorama do Super 8, Cinema e Vídeo. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/ enciclopedia/cinema/index.cfm?fuseaction=de talhe&cd_verbete=5246. Acesso em: 2 mai. 2012b.
MALLARMÉ, S. Un coup de dés jamais n’abolira le hasard. Paris: Gallimard, 1993.
MCSHINE, K. Information Exhibition Research, The Museum of Modern Art Archives, New York. Disponível em: < moma.org/learn/resources/archives>. Acesso em: 9 Set. 2012
__________Information, Nova Iorque: MOMA, 1970.
MELLO, C. Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora Senac, 2008.
__________Videoinstalações: prenúncios de poéticas contemporâneas. 16° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas. Dinâmicas Epistemológicas em Artes Visuais, Florianópolis, 24 a 28 de set. 2007. Disponível em: www.anpap.org.br/anais/2007/2007/artigos/014.pdf. Acesso em: 29 abr. 2012.
MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. Tradução de C. A. R. de Moura. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
METZ, C. A significação no cinema. Tradução de Jean-Claude Bernardet. São Paulo: Perspectiva / Universidade de São Paulo, 1972.
MORSE, Margaret. Video installation art: the body, the image, and the space-in- between. In Hall, Doug e Sally Jo Fifer (org.). Illuminating Video – an Essential Guide to Video Art. New York: Aperture, 1990.
NAPOLITANO, M. Cultura Brasileira: utopia e massificação (1950-1980). 1.ed. São Paulo: Editora Contexto, 2000. v.1. 136p.
NAVAS, A.M. Anna Bella Geiger: Territórios, Passagens, Situações. Rio de Janeiro: Casa da Palavra: Anima Produções Culturais, 2007. 356p.
NETO, T. Geleia Geral. Última Hora, Rio de Janeiro, 19/10/71. In Torquatália: obra reunida de Torquato Neto. Paulo Roberto Pires (org.). Rio de Janeiro: Rocco, 2004.
NIETZSCHE, F. A origem da Tragédia. Tradução de Álvaro Ribeiro. 5a ed. Lisboa: Guimarães Editores, PUC-Rio, 1988.
__________Assim Falou Zaratustra. Coleção Obra-prima de Cada Autor. São Paulo: Martin Claret, 1999.
__________Crepúsculo dos ídolos: ou como filosofar com o martelo. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2000.
ONO, Y. Grapefruit: A Book of Instructions and Drawings. New York: Simon&Schuster, 1964.
O’PRAY, M. Avant-garde film: forms, themes and passions. Londres: Wallflower, 2003.
OSÓRIO, L.C. EU SOU APENAS UM! As experiências de Flávio de Carvalho. In Caderno Videobrasil. Associação Cultural Videobrasil, no. 1, p. 8-16, São Paulo, 2005.
PARENTE, A. A imagem-máquina: a era das tecnologias do virtual. Rio de Janeiro: Editora 34,1993.
RAMOS, F. Cinema Marginal (1968/1973): A Representação em seu Limite. São Paulo, SP: Brasiliense, 1987.
REES, A. L. A History of experimental film and video. Londres: BFI, 1999.
ROCHA, G. Uma Estética da Fome. In Revista Civilização Brasileira, Rio de Janeiro:1965.
ROCHA, M.L., Maranhão-Manhattan: ensaios de literatura brasileira. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009.
ROUILLÉ, A. Da Arte dos fotógrafos à fotografia dos artistas. In: Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. N.o 27, dez. 1998.
RUSH, M. Novas Mídias na Arte Contemporânea. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
SANTAELLA, L. Culturas e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus. 2003. p. 162.
SIGMUND, Freud. Sobre os sonhos. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1973.
SOUSÂNDRADE. O Guesa. Londres: Cooke e Halsted, The Moorfields Press, 1888.
SUPEROITO: mais forte e mais vivo. Panorama. Curitiba – PR. no225, p. 21-23, abr. 1975.
VIEIRA, D.V., A projeção do corpo no contexto da obra: uma reflexão a partir da instalação “A Casa é o Corpo” de Lygia Clark. Disponível em: http:// www.sibila.com.br/index.php/estado-critico/215-a-projecao-do-corpo. Acesso em: 15 mai. 2012.
VOSTELL, W. Catálogo da exposição Dé-coll/age. The Art of Wolf Vostell. Bélgica: Verbeke Foundation, 14.04.2012 a 29.07.2012.
XAVIER, I. (Org.) A experiência do cinema. Rio de Janeiro: Graal, 1983.
YOUNGBLOOD, G. Expanded Cinema. New York: Dutton, 1970.
ZAPP, A.; RIESER, M. New screen media: Cinema/Art/Narrative. Londres: BFI, 2002.

Outros sites Consultados:

http://silent–watcher.blogspot.com.br/
http://www.canalcontemporaneo.art.br
http://www.dopropriobolso.com.br

 

 

NOTAS DE RODAPÉ

 

62 Imagem disponível em: http://silent–watcher.blogspot.com. Acesso em: 09 jan. 2012.

63 Para uma leitura mais detalhada de como os artistas começaram a fazer uso de novos meios para expressão de sua arte: Cf. RUSH, M. Novas Mídias na Arte Contemporânea. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

64 Manifesto on Art / Fluxus Art Amusement by George Maciunas, 1965. Disponível em: http:// www.artnotart.com/fluxus/gmaciunas-artartamusement.html. Último acesso em: 4 Fev. 2012.

65 Importante pontuar que Oiticica não acordava a arte conceitual, também da década de 1970, onde a ideia e o processo eram mais importantes que o objeto final. Para os artistas do grupo Fluxus, e também para Hélio Oiticica, o trabalho final existe, mas a imagem não é valorizada com caráter sagrado, o que o faz existir é a participação das pessoas, o fluir corporal e mental.

66 Do latim, significa “movimento”, “fluxo”, “corrente”, “processo”.

67 Manifesto on Art / Fluxus Art Amusement by George Maciunas, 1965.

68 Com os ready-mades, Duchamp se apropriava de objetos industrializados e produzidos em massa, que faziam parte do cotidiano, e os expunha em instituições artísticas. De uma maneira geral, através desse gesto, atribuía ao objeto o status de obra de arte. Ironizava o objeto artístico consagrado e, assim, tinha a intenção de reduzir todas as criações artísticas ao plano dos objetos comuns, criando o conceito de antiarte. Para os artistas do Fluxus, a arte deveria ser retirada dos museus e instituições e inserida no cotidiano das pessoas, que deveriam compreendê-la participando dela.

69 No Manifesto escrito em 1963 há frases como: “destruam os museus de arte” ou “destruam a cultura séria”. Disponível em: http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo5/fluxus.html. Último acesso em: 08 Jan. 2012.

70 Assim como o apartamento de Oiticica em Nova York chamava-se Babylonests, o de Maciunas chamava-se Fluxhall.

71 “Shelter”, do inglês: “abrigo”.

72 Ironicamente ao repúdio de Hélio Oiticica às instituições de arte, sua obra é hoje reverenciada em espaços oficiais da arte contemporânea, principalmente através de exposições.

73 OITICICA, Hélio. Hélio Oiticica. Carta ao Guy Brett, 2 de abril de 1968. Rio de Janeiro: Rioarte, 1996. p.135.

74 “We’re in transition from the Industrial Age to the Cybernetic Age, characterized by many as the post- Industrial Age”. YOUNGBLOOD, op.cit., p. 41.

75 O único equipamento existente e usado no Brasil, por essa época, era a câmera Portapack da Sony, com imagens P&B.

76 O termo tropicalista surge aqui no mesmo sentido explicitado por Rubens Machado em texto da Mostra Marginália 70, em que foi curador (Ver Bibliografia).

77 O Super-8 e o primeiro formato de câmera de vídeo, o Portapak da Sony, surgiram no mesmo ano, em 1965.

78 Diz Arlindo Machado: “A pertinência dessa produção e sua sincronia com os vídeos realizados em outros países foram notadas claramente na exposição internacional Video Art, no Institute of Contemporary Art, University of Pennsylvania, Estados Unidos, que exibiu em 1975 uma seleção de vídeos realizados por alguns artistas brasileiros” (2003, p.10).

79 Materiais a serem sentidos: areia, vinil, água, lixas, colchões, etc.

80 Trecho de texto de Hélio Oiticica encontrado em “Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13”. Trata-se de texto do Arquivo do Centro de Arte Hélio Oiticica, no Rio de Janeiro, e transcrito por Ivana Bentes. Aqui Oiticica se refere ao bloco-experiência Nocagions.

81 Segundo Luiz Camillo Osório, esta citação é parte de um texto inédito do artista Antonio Manuel realizado para a Funarte no ano de 1975.

82 O próprio artista havia informado à imprensa sobre o acontecimento.

83 Conceito-designação de Lygia Clark.

84 “Arte é o exercício experimental da liberdade” é uma definição que foi pronunciada por Mário Pedrosa e que apareceu pela primeira vez em um artigo do Correio da Manhã, em março de 1968. Repetida muitas vezes por Hélio Oiticica, para definir, de uma parte, o momento de ruptura com o Modernismo e, de outra, para sintetizar o experimentalismo e o conceito de participação existente em sua poética.

85 In [In Rudolf Frieling e Dieter Daniels (org). Medien Kunst Aktion: Die 60er Und 70er Jahre in Deutschland / Media Art Action: Yhe 1960s And The 1970s in Germany. Viena/ Nova Iorque: Springer, 1997. pp. 58-59. Tradução de Rejane Cantoni encontrada em Videoinstalação? Conheça melhor esta linguagem (que já foi para o espaço): Discussão sobre o percurso da linguagem e reflexão sobre a obra do artista Antoni Muntadas.

86 Tradução da autora.

87 Diferentemente, a geração de 1980 procurou estruturar as linhas mais significativas dos formatos dos trabalhos com vídeo, em busca da criação de uma estética própria. Já a geração de 1990, como nas décadas de 1960/1970, também buscou trabalhar com suportes híbridos em busca do sensorial, como busca de insurgimento de pensamento e corporalidade. Para estudo mais específico da história do vídeo, ver MACHADO, A. e MELLO, C. Ver Bibliografia.

88 Essa mostra ocorreu em 1975, na Galeria Maison de France, no Rio de Janeiro.

89 Além do seu approach “caseiro” com o cinema, Cao Guimarães, assim como fez Hélio Oiticica em seus apartamentos em Nova York – onde ficava dias a fio, lendo, escrevendo, fotografando, gravando, com sons e tv ligados, tudo ao mesmo tempo – produziu pequenos trabalhos, “uma espécie de diário filmado” (LINS, 2012), através do “vídeo, super 8, 35 ou 16 mm, câmera fotográfica digital, caixa de sapato, câmeras de plástico, caneta, lápis, laptop, máquina de escrever, gravador de som, microfone, projetor de slides, projetor de vídeo e de cinema e mais uma infinidade de coisas” (Cao Guimarães apud LINS, 2012).

90 Palavras do artista encontradas em texto na contracapa do vídeo Rua de Mão Dupla.

91 No original: “le Cosmodrome se comprend d’abord comme un son et lumière, entre œuvre d’art totale et environnement ‘générateur de sensation’”. Tradução livre da autora.

92 O título deste filme foi inspirado no poema “Tentativa de coroação: Roberto Piva”, de Beso. Ver Bibliografia.

93 Disponível em: http://www.canalcontemporaneo.art.br/arteemcirculacao/archives/000902.html. Último acesso em 2 Fev. 2012.

94 Em um jogo de ilusão, Duchamp travestia-se de Rrose Sélavy e Man Ray o fotografava.

Natasha Marzliak é artista visual e pesquisadora, sua produção teórica e prática se constrói nos cruzamentos do cinema, vídeo e novas tecnologias no contexto da arte contemporânea. Bacharel em Artes Visuais, mestra em Cultura Audiovisual e Mídia e doutoranda em Multimeios e Arte na UNICAMP e em Cinema e Audiovisual na Université Panthéon-Sorbonne Paris 1. Como formação complementar, estudou Vídeo, Fotografia e Multimídia na École Supérieure d’Arts de Grenoble; e História da Arte Moderna e Contemporânea, Literatura Francesa e Cinema Francês na Université Paul Valéry Montpellier 3.