Encapei o coração de esparadrapo
Subi em tijolo enfaixado um muro de orgulho
Colei a ponta do salto tropeçado
Remendei o vestido rasgado
Por esse amor que me fere e me desnuda
Em carne, pele e osso viva
Como se a mãe, a avó e a tia
Do leite do peito em idas e idas
Na linha do tempo
Corressem-me a veia de partidas
Histórias repetidas de sexos frágeis
E quando bateres em minha porta
Não encontrarás umedecendo meus olhos
Uma lágrima sequer
De todas fiz-me relva verde
Intensa e adubada
Ora escura e sombria mata
Que teus arroubos de homem não ousam adentrar
Ora gramínea primaveril
Estourando pássaros piu em piu
E flores passos espelho céu anil
Donde rebentando o cordão que me cobriu
Do umbigo da fonte, a mãe que me pariu
Sou eu alfândega e barreira
Sou eu fronteira
Quem diz
Quem entra
Quem sai
Quando e Como
Enquanto
Por enquanto
Todos advérbio do verbo do meu querer
* Rel-vivesci é inédito e foi escrito em 2016, quando Larissa vivia uma relação abusiva. A imagem de capa desta publicação é da obra Grau 2, de Maíra Freitas, registrada por Carolina Mantovani.
Larissa Ibúmi Moreira é escritora, pesquisadora e feminista negra-interseccional. Formou-se em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo; e é mestranda em História e graduanda em Jornalismo pela Universidade Federal de São João Del Rei. Realiza pesquisas na área de História da África e dos afrodescendentes no Brasil, além de temas como feminismo negro e identidades de gênero na música brasileira. Como escritora, lançou o livro “Vozes Transcendentes: os novos gêneros na música brasileira”, hoo editora (2018). Teve textos e entrevistas sobre cinema e cultura afro-brasileira publicados no Geledés – Blogueiras Negras e na Carta Capital. Se iniciou no universo do cinema em 2017, convidada pela cineasta Anna Muylaert a trabalhar como assistente. No mesmo ano, passou a integrar a equipe de desenvolvimento Mira Lab. Atualmente, trabalha com Pesquisa História e Geral para Audiovisual e escrita de projetos e editais.