Já há tempos nada mais está em seu lugar, ou ao menos no lugar onde costumava estar. A questão parece ser justamente essa: não há mais “o lugar das coisas”. A humanidade parece estar em vias de desistir em definitivo da prática de compartimentar tudo, cada coisa que existe nesse mundo. Dançando esta música, o HIPOCAMPO traz em sua terceira edição conteúdos de Ana Luisa Lima, Duane Bahia Benatti, Jurandy Valença, Lilian Maus, Lucas Guedes, Lucila Vilela e Marcelo Beso Veronese, além dos estreantes Claudia Rodriguez Ponga, Pedro Campanha e William Galdino.
Ana Luisa Lima abre a terceira edição do HIPOCAMPO desconstruindo a insistente figura do herói, presente em todos os capítulos da história da humanidade: um mero artifício para ocultar os impulsos humanos pelo poder e a violência decorrente das disputas por ele. Em Adeus aos Heróis traz também sua percepção da ditadura no Brasil, vista por ela como uma ferida ainda aberta e não devidamente tratada. Fala da introdução da cultura do medo, do cultivo da apatia e da capacidade da arte de armazenar e revelar fragmentos da história.
No ensaio Sobre Shandys e Bruxas: notas para um ensaio sobre exílio e arte, Claudia Rodriguez Ponga explora a relação do Exílio – entendido como fenômeno ligado à mobilidade de pessoas que fogem da própria terra na tentativa de sobreviver, ou ainda como “mecanismo de regulação para sistemas políticos incapazes de criar modelos de participação plurais e inclusivos” – com o exílio interno, e como esta noção está ligada ao universo da arte e do artista. Aplicando uma metodologia mito-crítica, Claudia apresenta “uma série de referências que remetem ao exílio como topos, como lugar no imaginário cultural ocidental”.
William Galdino apresenta o Caderno que o acompanhou ao longo de 2012 e 2013. Nas mãos do artista, o caderno representa um refúgio de fácil acesso, uma brecha tempo-espacial de exílio voluntário, ou autoexílio, para exercício do pensamento, do traço e da cor sobre o papel. Pode ser visto ainda como um ateliê portátil que abriga a criação espontânea e captura ideias, imagens e momentos de forma imediata e inlocu.
Marcelo Beso Veronese partiu do poema Autoterrorismo – publicado em seu livro NOJO pela Editora Urutau em 2016 – para criar um vídeo-poema homônimo que fala, sobretudo, de paradigmas sócio-culturais e seu reflexo sobre a gestão do patrimônio público, seja ele tangível ou intangível. As imagens são da dependência que dava acesso à Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp, destruída em 2013 por um incêndio, e abandonada da mesma forma até hoje.
Em Hilda Hilst: Um Caracol de Fogo, Lúteo-Rajado, Jurandy Valença traz parte de suas riquíssimas memórias relacionadas à festejada escritora, com quem conviveu intimamente no princípio da década de 90, na Casa do Sol, localizada em Campinas/SP. De fala amorosa, conta como Hilda orientou sua produção escrita e também sobre sua visão e admiração por sua pessoa e obra: “Assim era Hilda para mim. Um fluxo contínuo de intensidades.”
Lucas Guedes aplica toda sua perspicácia e abusa da metalinguagem ao investigar a fórmula das relações amorosas na contemporaneidade no texto http: // (a + b)2 = a2 + 2ab + b2 . O personagem A, autodefinido como um escravo das tecnologias e amante do mundo virtual, ao mesmo tempo que escreve um artigo sobre o impacto dos avanços tecnológicos e da internet na vida das pessoas, troca mensagens com o personagem B, seu antigo parceiro de quem recém separou-se.
Desde os primeiros experimentos cinematográficos dos irmãos Lumière e de Georges Méliès, em fins do século IXX, a produção cinematográfica sempre andou nos calcanhares das evoluções tecnológicas. Em Kinetos: Georges Méliès em primeiro plano, Lucila Vilela fala deste que foi um dos mais emblemáticos e inesquecíveis criadores, considerado por muitos o “pai” dos efeitos especiais e da ficção científica.
A segunda edição da coluna do DUANE visita a fábrica Promprylad, localizada em Ivano Frankivsk, Ucrânia. Atualmente a centenária planta fabril abriga a organização não governamental Promprylad. Renovation, um centro de inovação na intersecção de 4 diretrizes para o desenvolvimento da região: educação informal, arte contemporânea, nova economia e urbanismo. O relato de DUANE parte de sua participação no workshop Promprylad – Patrimonio Industrial, realizado ao longo de 14 dias em Ivano Frankivsk e Berlim.
Subterrânea traz as experiências de seis artistas – dentre eles a colaboradora do HIPOCAMPO Lilian Maus – à frente do espaço de arte independente Atelier Subterrânea, entre 2006 e 2009 em Porto Alegre. O espaço, que encerrou suas atividades em fins de 2015, funcionava como um laboratório experimental e multidisciplinar aberto à propostas diversas. Através de uma rede composta por artistas, críticos e um público diverso, o Subterrânea tinha como objetivo fortalecer o circuito independente das Artes Visuais. O livro traz ainda obras realizadas especificamente para este múltiplo, com participações de Cildo Meireles, Edith Derdyk, Lia Menna Barreto, Gerson Reichert, dentre outros.
Encerra a terceira edição do HIPOCAMPO Pedro Campanha, com sua Apostila do método de Rubens Espírito Santo. Orientando de Rubens Espírito Santo (RES), professor de desenho expandido do método RES e membro do Atelier do Centro (São Paulo/SP) entre 2013 e 2017, Pedro apresenta nesta Apostila relatórios das aulas por ele ministradas entre setembro e outubro de 2016, acompanhados de referências do método RES e registros fotográficos das atividades realizadas.
Bem vindxs ao HIPOCAMPO!
Maíra Endo
Curadora-editora do HIPOCAMPO #3