As pessoas dos 482 anos

AT|AL 609
Campinas, São Paulo

Imagem 01: Geovanni Lima, caderno de artista. Fonte: Acervo do artista.

Durante uma residência artística realizada no espaço cultural AT|AL 609, em Campinas, SP, operando a partir da relação entre o espaço da cidade e o meu corpo negro, articulo questões pertinentes à história negra campineira. Para essa operação poética, escolho como territórios para atuação o Museu do Negro de Campinas, localizado no Cambuí, bairro historicamente negro, mas hoje ocupado pela elite branco-burguesa da cidade; e o Largo São Benedito/Campo da Alegria, espaço outrora destinado ao sepultamento de negros escravizados. Ambos os territórios estão entregues ao esquecimento e sucateamento de nossas memórias.

Partindo da pergunta “Onde estão os negros em Campinas?”, realizo duas ações performáticas de longa duração por esses espaços. Na primeira, estabeleço o território de Oxalá, que, ao ser preso em uma masmorra e entregue ao esquecimento por sete longos anos, tem sua história justiçada por Xangô que determina que todos vistam branco em seu nome. Para essa performance, me coloco a caminhar da AT|AL 609 até o Museu do Negro de Campinas vestindo branco e portando uma bandeira em grande escala da mesma cor, que tremulo até que meu corpo se esgote.

A segunda performance, realizada no Largo São Benedito/Campo da Alegria, constitui-se a partir do desejo de honrar as pessoas escravizadas que estão sepultadas nessa localidade e que não possuem qualquer menção na história da cidade. Utilizando a Cinerária Marítima, planta medicinal empregada para produção de colírios, apresentada a mim por um griô durante uma visita ao mercado de flores de Campinas durante o período de residência, reproduzo uma cruz em grande escala pelo espaço do largo com mudas da referida erva, que ficaram disponíveis para manipulação dos transeuntes. A partir dessas ações, levo para o espaço expositivo os processos que atravessaram meu corpo em estado de performance, os quais apresento a seguir:

Imagem 02: Geovanni Lima, caderno de artista. Fonte: Acervo do artista.
Imagem 06: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, Instalação. Adesivo autocolante branco [ONDE ESTÃO OS NEGROS EM CAMPINAS?], bandeira branca [algodão cru, com medidas de 2,30 m x 2,25 m]. Dimensões variadas. AT|AL 609, Campinas, São Paulo. Imagem: OEFEHÁ
Imagem 07: Geovanni Lima, caderno de artista. Fonte: Acervo do artista.
Imagem 08: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, documento de performance. Largo São Benedito/Campo da Alegria, Campinas, São Paulo. Imagem: OEFEHÁ
Imagem 09: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, documento de performance. Largo São Benedito/Campo da Alegria, Campinas, São Paulo. Imagem: OEFEHÁ
Imagem 10: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, Instalação. Cinerária marítima [mudas], sacos plásticos pretos e terra, posicionados em formato de cruz. Dimensões Variadas. AT|AL 609 , Campinas, São Paulo. Imagem: OEFEHÁ
Imagem 11: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, Instalação. Coroa de flores secas e cavalete. Dimensões variadas. AT|AL609, Campinas, São Paulo. Imagem: OEFEHÁ

Nota do autor 1: Imagens 03, 04 e 05: Geovanni Lima, As pessoas dos 482 anos, documento de performance. AT|AL 609, Igreja Nossa Senhora das Dores e Museu do Negro de Campinas. Campinas, São Paulo. Imagens: OEFEHÁ.

Nota do autor 2: Processo criativo e imagens da exposição disponíveis em:

https://atal609.com.br/2021/10/08/geovanni-lima-as-pessoas-dos-482-anos/

*As pessoas dos 482 anos foi escrito em 2021, após a finalização da residência artística de Geovanni Lima no AT|AL 609, em Campinas/SP. É inédito.

Geovanni Lima é artista visual e performer, pesquisador e educador. Doutorando e Mestre em Artes Visuais pela UNICAMP e licenciado em Artes Visuais pela UFES, com participação em diversos eventos de arte, como Maluguxs – Residência Artística (2021); UNICAMP QUEER (2020); XI Encuentro Internacional do Hemispheric Institute, da New York University (NYU) (2019); p.ARTE nº 42, da Plataforma de Performance Arte no Brasil (2019); Mostra de Performances Movediça (2019); Residência e Festival Corpus Urbis – 4ª edição – Oiapoque/AP (2018); e Festival Aldeia SESC Ilha do Mel (2017, 2018). Dentre as exposições de arte, destacam-se: As pessoas dos 482 anos (2021, exposição individual na Galeria ATAL 609); CORPO-EXPERIMENTO (2021, Museu de Arte do Espírito Santo); Diaspórica (2020, Instituto das Pretas); Atos de Mover (2018, Galeria Capibaribe); e Territórios Internos (2018, Casa Porto das Artes Plásticas). É um dos propositores do projeto Performe-se – Festival de Performance (2015, 2017) e coordena o Festival Lacração – Arte e Cultura LGBTQIA+ (2019, 2021), ambos no Espírito Santo. Em 2021 foi um dos artistas indicados ao Prêmio Pipa e um dos finalistas do Pipa Online.